segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

FIM DA LEI DA MORDAÇA: APENAS PARA OS PROFESSORES

O projeto de lei mencionado na notícia que reproduzimos abaixo é de grande importância, porque chama atenção para um grave problema existente no serviço público em geral, que é a proibição dos servidores se referirem de modo depreciativo à administração pública. Trata-se de um verdadeiro absurdo e de uma aberração legal oriunda dos tempos ditatorias, que não se coaduna com o Estado Democrático de Direito.
Infelizmente, o projeto foi tímido e tratou apenas da situação específica dos professores. Teria sido muito melhor se revogasse todos os dispositivos legais que proibem ou penalizam servidores públicos de tecerem críticas à administração. Os servidores públicos, sejam eles policiais, professores, médicos, atendentes, escriturários etc. conhecem os problemas e as mazelas do poder público em relação a sua área de atuação; por isso, sua opinião deveria ser desejada pela sociedade e não proibida por legislações retrogradas.
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Liberdade de expressão
SP aprova projeto que revoga lei da mordaça
No aniversário de 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, no último dia 10 de dezembro, a Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo aprovou o projeto de lei complementar n° 81/2007, do Deputado Roberto Felício (PT-SP), que revoga o artigo 242 do Estatuto dos Funcionários Públicos. O artigo ficou conhecido como “lei da mordaça na educação”, pois proíbe os professores de se referirem “depreciativamente (...) às autoridades constituídas e aos atos da Administração”. Agora, o projeto será encaminhado para o governador José Serra, que terá 30 dias para apreciar a decisão do Legislativo. Se aprovada, este será mais um passo na garantia de um direito negado aos funcionários públicos de São Paulo há décadas: a liberdade de expressão.“Não poderíamos ter sido brindados com melhor presente no dia da celebração dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos”, afirma Paula Martins, coordenadora do escritório brasileiro da Artigo XIX, organização que luta pela liberdade de expressão. Paula acredita que, com este passo, aos poucos, outros setores dos servidores públicos começarão a se mobilizar num movimento de pressão pela derrubada da Lei da Mordaça. “Recebemos com muito entusiasmo a notícia e acreditamos que agora será muito difícil o governador José Serra voltar atrás, visto que a própria secretária da educação do estado apoiou a campanha há alguns dias publicamente”, afirma Paula. “Independentemente das outras divergências que temos com a secretária, vamos contar com ela”, disse o deputado estadual Roberto Felício.O professor Carlos Ramiro, da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo), também ressalta a importância do apoio da secretária e afirma que a revogação é uma vitória. “Espero que seja o início de uma democratização mais ampla na liberdade de expressão dos professores”. “Para garantir que isso aconteça de fato, precisamos mobilizar outras organizações e setores da sociedade e comemorar com antecipação este primeiro passo. Assim, o governador vai apreciar a matéria sentindo a nossa força”, afirma Paula.
Menos um, faltam 17
Mariângela Graciano, coordenadora do Observatório da Educação da Ação Educativa lembra que ainda restam 17 estados onde a lei existe e, por conseqüência, existe luta para derrubá-la. Lembra também que o fim da lei em São Paulo é o fim de um elemento importante que impedia a participação dos profissionais de educação no debate público sobre as políticas da área, mas que é apenas um passo no importante e amplo processo de valorização dos profissionais da educação. “Precisamos de outros mecanismos para resgatar a imagem social dos professores e professoras que vêm sendo sistematicamente responsabilizados pela insatisfatória qualidade da educação e têm se sentido acuados e inibidos de participar ativamente da formulação de políticas educacionais”, diz, lembrando que a Campanha Fala, educador. Fala, educadora! se insere em um conjunto de ações da Ação Educativa que visam o fortalecimento e a valorização do magistério, a exemplo da mobilização em favor da lei do piso nacional salarial do magistério. Também, destaca a importância dos profissionais da comunicação na conformação da campanha. “É bom lembrar que foram jornalistas empenhados em cobrir a educação de maneira justa que nos alertaram sobre o medo dos profissionais da educação em falar com a imprensa”, diz.

domingo, 21 de dezembro de 2008

SEM LIBERDADE DE EXPRESSÃO NÃO HÁ TRANSPARÊNCIA



Hu Jia (dir.) e a mulher, Zeng Jinyan; ativista cumpre pena na China por incitar subversão
(Foto obtida na Folha Online)
A internet é uma ferramenta realmente revolucionária. A notícia abaixo demonstra como ferramentas que facilitem a divulgação do pensamento auxiliam a combater regimes ditatoriais, como o da China.


Devemos lutar contra iniciativas estatais que visem controlar os meios de comunicações. A pretexto de coibir supostos abusos, criam-se mecanismos para restringir a liberdade de expressão. É preferível conviver com alguns abusos do que com censura governamental, regulando aquilo que pode ou não chegar ao conhecimento do público.


Uma verdadeira democracia se constrói com uma sociedade e instituições transparentes. A transparência se conquista com ampla e irrestrita liberdade de expressão.





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Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u480861.shtml






18/12/2008 - 08h20
União Européia premia blogueiro chinês preso

RAUL JUSTE LORES
da Folha de S.Paulo
Em uma semana marcada pelo aumento da repressão à dissidência na China, o Parlamento Europeu aplaudiu de pé por um minuto o ativista chinês Hu Jia, 35, durante a entrega do Prêmio Sakharov dos Direitos Humanos.
O homenageado não pôde comparecer. O blogueiro Hu, conhecido por defender causas tão diversas como liberdade de expressão, ecologia e vítimas de transfusão de sangue contaminado, foi condenado a três anos e meio de prisão por "incitar subversão contra o Estado" e cumpre pena em Pequim.
Elizabeth Dalziel/AP
Hu Jia (dir.) e a mulher, Zeng Jinyan; ativista cumpre pena na China por incitar subversão
Na semana passada, vários outros dissidentes chineses também foram presos após assinar uma carta de protesto, pedindo mais democracia, durante o aniversário da Declaração dos Direitos Humanos.
Mesmo antes do anúncio de que Hu seria premiado com o Sakharov, a principal distinção do Parlamento Europeu, o embaixador chinês para a União Européia mandou uma carta de ameaça, dizendo que, se o ativista fosse premiado, "as relações da UE com a China ficariam seriamente afetadas".
No início do mês, o governo chinês cancelara uma cúpula com a UE pela intenção do presidente francês, Nicolas Sarkozy, à frente do bloco, de se encontrar com o dalai-lama, líder religioso do Tibete, em reunião com outros Nobel da Paz.

Censura exportada
Vários sites que podiam ser acessados na China desde a Olimpíada de Pequim, em agosto, voltaram a ser bloqueados na semana passada. O veto atinge páginas de publicações de Hong Kong, como Asiaweek e Ming Pao, blogs e o site da rede estatal britânica BBC.
O porta-voz da Chancelaria Liu Jianchao disse na terça que o governo chinês tem o direito de censurar sites que violem as leis do país. Ele afirmou que alguns sites, sem citar quais, falam de Taiwan e China como dois países, sem aceitar a política chinesa de "uma só China".
Nos últimos anos, a censura chinesa tem bloqueado mais sites em tempos de crise. A economia do país está em processo de forte desaceleração, com a ameaça de deixar milhões de desempregados.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

FRASE



"A verdade é filha do Tempo e não da Autoridade".


Autor desconhecido.

VOTO NULO: MANIFESTAÇÃO LEGÍTIMA DO ELEITORADO!

Publico abaixo artigo bastante elucidativo a respeito do voto nulo.
O voto nulo é uma manifestação legítima do eleitor, porque manda o recado de que nenhum dos candidatos satisfaz as espectativas.
Além disso, se o voto é um direito, o eleitor não deveria ser obrigado a exercê-lo. Por isso, anular o voto é uma das maneiras, senão a única, de demonstrar seu descontentamento.
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14 novembro 2008
Editorias - Política
Domingo, após encerrado o segundo turno das eleições municipais, houve um debate na Globo News em que se discutia a quantidade de abstenções, votos nulos e brancos na cidade do Rio de Janeiro. A horas tantas, o locutor vira-se para um dos comentaristas e pergunta: "A que se deve a falta de consciência política desse eleitorado que deliberadamente deixa de exercer o direito de voto?".
O comentário do apresentador, malgrado estúpido, resume com precisão a mentalidade reinante no país, onde o exercício do voto é considerado por muitos, especialmente as autoridades e os formadores de opinião, assunto de suma importância, quando não a panacéia para os problemas do país em geral e dos indivíduos em particular. A Justiça Eleitoral, por exemplo, nas suas inúmeras inserções publicitárias durante o período eleitoral, passava a mensagem de que o futuro de cada cidadão dependia do respectivo voto. Implicitamente, estavam nos dizendo que nossa vida será boa ou ruim não pelo que nós fizermos em nosso trabalho diário, nosso empenho e dedicação nos afazeres do dia-a-dia, etc., mas sim pelas escolhas que fizermos nas urnas.
A cada eleição, mais gente compra essa idéia tacanha e deposita, junto com o voto, todas as suas esperanças no governo provedor e inesgotável, esquecendo-se de que o sucesso de cada um não está na benevolência dos políticos e burocratas, mas na motivação, na determinação, na disciplina e, acima de tudo, no trabalho árduo. Eu não sei que futuro pode ter uma nação em que os indivíduos, na sua maioria, confiam cada vez menos no esforço próprio e muito mais nas graças de governos populistas e distributivistas.
Aliás, eu sei: essa filosofia política levará o Brasil à ruína. Nenhuma sociedade progride baseada na dependência do governo; na cultura que penaliza o mérito e premia a preguiça.
Essa é, não por acaso, a mesma mentalidade velhaca que determina a obrigatoriedade do voto. Esta imposição, aliada à maciça propaganda segundo a qual a solução dos nossos problemas depende do bom uso que fizermos desse "direito" – entre aspas, sim, pois um direito legítimo não pode jamais ser imposto coercitivamente –, ao mesmo tempo em que legitima o mandato político dos abutres que aí estão, acaba reforçando a tese funesta de que o nosso futuro não depende de nós mesmos, mas do acerto com as urnas.
Por isso, é estúpido dizer que abstenção é sinônimo de falta de consciência política. Pelo contrário, nas atuais circunstâncias, esta é a única forma de dizer que não concordamos com a mentalidade reinante.
Eu votei nulo, tanto no primeiro quanto no segundo turnos. Aqui no Rio de Janeiro não consegui achar um só candidato a vereador que merecesse o meu voto. Não havia um só que, nem de longe, tivesse idéias próximas das de um liberal.
(Um amigo chegou a convidar-me para uma pequena reunião em sua casa, onde estaria um candidato que faria apresentação de suas propostas. O garoto era muito bem articulado e discorreu sobre as centenas de projetos que já propôs e outros tantos que pretendia propor caso reeleito. Falou sobre sua luta por transporte gratuito para estudantes e velhos, etc. Depois que ele acabou o discurso, levantei e disse, em tom jocoso, que a cada um dos projetos de lei que ele citava, o meu bolso doía. Falei que "não existe almoço grátis" e todas aquelas coisas que um liberal chato gosta de mencionar, como "as leis abundam em estados corruptos", etc. Perguntei se ele sabia quanto o IPTU da cidade havia subido durante a última legislatura, mas isso ele não soube responder. Pedi-lhe então que, em seu próximo mandato, esquecesse um pouco a fartura de projetos e pensasse mais em atuar como um fiscal dos gastos municipais e dos aumentos de tributos. Se o meu discurso serviu para alguma coisa, só o tempo dirá.)
Para prefeito também não havia um só candidato que eu pudesse escolher sem o constrangimento de estar votando contra as minhas idéias e convicções. Fora a candidata do prefeito atual, cuja última administração foi uma lástima, só havia gente da esquerda mais retrógrada. No fim, sobraram Gabeira – candidato do PV e queridinho da Zona Sul, apoiado por gente da estirpe de Oscar Niemeyer e Leonardo Boff – e Eduardo Paes, que entre outras coisas aliou-se a Lula, depois de tê-lo escorraçado durante a CPI do Mensalão. Entre os seus adeptos de última hora figuravam Benedita da Silva e Vladimir Palmeira. Uma lástima!
Alguns amigos tentaram convencer-me a votar no Gabeira. Alegavam que o voto útil, nesse caso, era uma boa alternativa. Agradeci, mas declinei do convite. Não podia, depois de tudo que já escrevi sobre a sanha ambientalista, por exemplo, votar em favor de alguém patrocinado pelo famigerado Greenpeace, além de apoiado por eméritos stalinistas e próceres da Teologia da Libertação.
A última vez em que optei por um "voto útil" foi na eleição de senador, quando, para rechaçar a comunista Jandira Feghali, votei em Francisco Dornelles. Arrependi-me! Dornelles não só aliou-se a Lula e ao PT, como tornou-se um dos maiores e mais persistentes defensores da prorrogação da CPMF (que Deus a tenha!) no Senado. Sua atuação foi exatamente no sentido oposto de tudo que eu defendo. Depois dessa, concluí que o "voto útil" é uma grande furada, e decidi que só voltaria a votar quando fosse a favor de alguém. Chega de votar contra!
Ao contrário do comentário daquele apresentador, o "não voto" demonstra muitas vezes muito mais consciência política do que o próprio voto, especialmente se utilizado, como no meu caso, como uma arma na luta contra a obrigatoriedade espúria do exercício daquilo que deveria ser um direito.
Eis por que acredito que esta possa vir a ser uma excelente bandeira. Vejam os números do Rio de Janeiro, diretamente do TRE:
Total de votos em Eduardo Paes: 1.696.195 = 37,03%
Total de votos em Fernando Gabeira: 1.640.979 = 35,85%
Total de abstenções, brancos e nulos: 1.242,200 = 27,13%
Daqui a uma ou duas eleições, dependendo do "approach" junto à opinião pública, quem sabe não chegaremos, senão à maioria, pelo menos ao primeiro lugar? Não é algo que se consiga da noite para o dia, claro, mas já não estamos muito distantes disso. Conheço muita gente que continua fazendo "voto útil". Será que parte desse pessoal não compraria a idéia, especialmente se visse nela alguma utilidade?
A lógica da estratégia é a seguinte: será difícil aos políticos ficar indiferentes, no dia em que as abstenções (mais nulos e brancos) tornarem-se maioria, pois a mídia certamente dará grande destaque ao fato. Além da fortíssima mensagem – a tal voz das urnas – que um resultado desse representaria, é inegável que, do ponto de vista moral, seria muito menos vergonhoso para eles (políticos) conviver com tal fato se o voto não fosse uma imposição legal.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

ATIVIDADE POLICIAL E SACERDÓCIO

Desde que ingressei na Polícia Civil do Estado de São Paulo ouço dizer que a Polícia é um sacerdócio. Isso sempre foi dito para justificar seu caráter de serviço público essencial e especial, com horários irregulares, plantões, risco para a vida, para a saúde e para a integridade física etc.
Discordo: o policial não é um sacerdote.
A Polícia Civil é uma instituição destinada, primordialmente, ao exercício da Polícia Judiciária, nos termos do que estabelece o artigo 144, parágrafo 4º, da Constituição da República:
§ 4º Às policiais civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares”.
Não obstante sua competência constitucional, outras tarefas administrativas eventualmente lhe são destinadas, por guardarem relação com as funções de polícia judiciária. Citamos, por exemplo, a expedição de documentos de identidade, administração de Departamento de Trânsito e ou Circunscrições Regionais de Trânsito, expedição de Atestado de Antecedentes, fiscalização de determinadas atividades etc.
Trata-se, portanto, de uma instituição destinada a prestar serviços públicos essenciais à sociedade. Os policiais que integram seus quadros passam por seleção através de concurso público, seguido de treinamento específico na Academia de Polícia, antes de iniciarem o exercício de suas funções. Possuem direitos e deveres que estão previstos em Estatutos estaduais que regulam os funcionários públicos civis, além de outros mais específicos que estão previstos em legislações específicas, tais como a Lei Orgânica da Polícia do Estado de São Paulo.
O sacerdócio, por seu turno, é atividade de cunho estritamente religioso, que pressupõe entrega absoluta de corpo e alma (literalmente). Por isso, não está sujeita a regulamentações do poder público, porque o sacerdote é um religioso que escolheu entregar a sua vida a uma causa ou doutrina religiosa.
Muitos sacerdotes, por exemplo, fazem votos de não contrair matrimônio, de não constituir patrimônio próprio, de viver e manter-se em absoluto silêncio, de obediência absoluta e irrestrita aos dogmas da Igreja, dentre outras diversas restrições e rigores que essas pessoas se auto-impõem como forma de purificação espiritual.
Por isso, o sacerdócio não pode ser categorizado como trabalho ou profissão, no sentido estrito do termo, porque extrapola esses conceitos, já que são escolhas pessoais daqueles que abraçam a vida religiosa, aceitando de livre e espontânea vontade aderir à doutrina e às restrições que lhe são impostas.
Portanto, por mais específica que seja uma determinada atividade profissional, por mais risco pessoal que o trabalhador se exponha, trata-se de atividade profissional, no sentido estrito do termo, e os riscos a que se expõem seus membros devem ser minimizados através de estudos científicos e de investimentos tecnológicos, porque não é razoável entender-se que o policial está obrigado a sacrificar sua vida e saúde sem qualquer contrapartida.
As dificuldades do trabalho policial devem ser, na medida do possível, diminuídas com o uso das novas tecnologias e estudos científicos que propiciem ao profissional um melhor desempenho de seu mister, tudo visando o interesse público (vide nosso artigo: “A Aplicação dos Princípios da Ergonomia no Trabalho Policial”).
Na Polícia Civil, por exemplo, a pretexto de denominá-la sacerdócio, acredita-se que o policial não necessita de vencimentos dignos, não necessita de plano de saúde e de seguridade adequados ao seu perfil profissional, não necessita de limite para sua carga horária de trabalho, não necessita de tratamento legal específico para sua aposentadoria, não necessita de equipamentos que lhe confiram máxima segurança para o exercício de suas atribuições, dentre vários outros direitos básicos que são desrespeitados.
A título de exemplo, indagamos:
Por que as viaturas policiais não possuem blindagem? Será que o custo de uma blindagem, que poderia salvar a vida de inúmeros policiais é alto demais? Porque todas as Delegacias não são dotadas de detectores de metais, como aqueles instalados em Bancos? A vida de um policial vale menos que uma blindagem ou um detector?
Por que viaturas não possuem Air-Bag, ABS, EBD, dentre outras tecnologias de segurança automotivas que se popularizaram e são acessíveis a um grande número de consumidores atualmente?
Porém, quando voltamos nossa atenção à triste realidade, constatamos que não precisamos falar de blindagem, ABS, Air-Bag e outros recursos ideais para a segurança do policial, porque sequer lhe são conferidos recursos que lhes propiciem condições mínimas de segurança.
De fato, não é difícil para ninguém constatar que circulam atualmente, em qualquer Estado da federação (e não somente das Polícias Civis), um sem-número de viaturas com pneus carecas, amortecedores vencidos, luzes de segurança queimadas, sistema de freios danificados etc. Não bastassem as viaturas, há prédios utilizados pelas Polícias que não suportariam uma inspeção de segurança e saúde do Ministério do Trabalho.
Estamos falando de condições mínimas (e não ideais) de segurança no meio ambiente de trabalho policial, que não são proporcionadas aos profissionais que arriscam sua vida e sua saúde para fornecer um produto cada vez mais escasso hoje em dia: segurança pública.
Autor: Emanuel M. Lopes, delegado de polícia em São Paulo, mestre em Direito.

domingo, 14 de setembro de 2008

A VONTADE POPULAR NÃO FOI RESPEITADA

O plebiscito sobre o desarmamento demonstrou claramente que a maciça maioria dos brasileiros são favoráveis à manutenção do direito daqueles que querem possuir armas de fogo legalmente.
No entanto, a legislação que regulamenta a aquisição e posse de armas, bem como as altas taxas cobradas, praticamente impedem o cidadão de exercer esse direito.
O direito de possuir armas foi elitizado.
As exigências legais exageradas fizeram com que apenas aqueles que possuem muito dinheiro para pagar altas taxas e contratar serviços especializados de despachantes, possam vencer a enorme burocracia que se criou, e que deve ser repetida a cada três anos (prazo de validade dos registros expedidos pela Polícia Federal).
A legislação que trata a respeito das armas saiu do oito para o oitocentos. Antes a lei era extremamente leniente com o porte ilegal de arma, mas atualmente passou a ser excessivamente rigorosa com aqueles que apenas desejam manter uma arma legalmente registrada em casa para defesa própria e de sua família.
Bastava que a lei antiga fosse reformada no sentido de punir severamente o porte ilegal de armas, mas exagerou ao colocar na ilegalidade milhões de brasileiros de bem, exigindo recadastramento de armas já devidamente registradas, bem como exigindo que o proprietário pague altas taxas e cumpra exaustiva burocracia a cada três anos, apenas para manter o registro e a propriedade legal sobre sua arma.
Essas exigências fizeram com que o comércio legal de armas e munições praticamente acabasse. Na maioria das cidades do interior, já não existe mais. Mesmo na cidade de São Paulo conta-se nos dedos as pouquíssimas lojas que restaram.
O ataque ao comércio legal de armas de baixo calibre (que são os permitidos) não impediu, no entanto, que o tráfico de armas continuasse de vento-em-popa, muito pelo contrário, tenderá a estimula-lo. Não impediu, também, o aumento dos índices de crimes violentos, como roubos e seqüestros.
Abaixo publicamos artigo muito interessante que demonstra outras incoerências a respeito da política adotada a respeito desse tema.

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Desarmamento: Olha eles de novo
por Peter Hof
em 12 de setembro de 2008, fonte: www.midiasemmascara.org
Resumo: Responsabilizar cidadãos de bem por tragédias que têm como origem "bala perdida" é ludibriar o contribuinte e não querer resolver o problema.

O título de uma matéria assinada por Jailton de Carvalho e publicada na página 15 do jornal O Globo, de 22/08/2008, é: Nova campanha de desarmamento é lançada pela União. O primeiro fato a chamar a atenção do leitor é que, enquanto nos "bons tempos" este assunto teria direito a chamada de capa – incluindo uma foto do Ministro da Justiça, com uma arma na mão, olhando-a com ar de desprezo – , agora a matéria é relegada a um espaço de 6x20 centímetros, escondido no pé da página 15. Tudo indica que o jornal O Globo, escaldado com o certeiro ponta-pé que levou na região glútea, por ocasião do Referendo de 23/10/2005, resolveu não se expor, nem se envolver nesse assunto.
Vamos analisar, em detalhe, o conteúdo da matéria e as opiniões do Ministro da Justiça:
O Ministro da Justiça, Tarso Genro, lançou ontem a nova campanha do desarmamento orçada em R$46 milhões. Nossas polícias, tanto a Militar quanto a Civil ou a Federal, de modo geral sofrem com a crônica falta de verbas para treinamento e reequipamento.
Não faria mais sentido usar esse dinheiro em atividades que resultem em melhora dos serviços de segurança ao cidadão, em vez de ficar fazendo pirotecnia eleitoreira?
Com a iniciativa, o governo espera recolher ou incentivar o registro de mais de 300 mil armas de fogo. Primeiro, é preciso separar as coisas: para registrar sua arma, o cidadão paga; para entregá-la, recebe (ou deveria receber) uma determinada quantia em dinheiro. O registro de uma arma não resulta em ônus, e sim em receita para o Estado. Desta forma, todo o desembolso ficará por conta das armas que forem entregues. Vamos assumir que 85% dos que entregarem suas armas receberão R$100, e 15%, R$300. Isso resultará em um desembolso médio ponderado por parte do governo de R$130 por arma recolhida. Como a verba destinada é de R$40 Milhões (mais R$6 Milhões para divulgação), conclui-se que o doutor Tarso tem como meta recolher 308 mil armas, de 21 agosto até 31/12/2008.O próprio governo informa que, durante a Campanha do Desarmamento que durou 22 meses – com direito ao que chamei de Caravana Rolidei do Desarmamento, apoio maciço das Organizações Globo, ONGs e Governos estrangeiros – conseguiu recolher 550 mil armas. Alguém acredita que agora, sem a antiga infra-estrutura de apoio e desgastados pela acachapante derrota no referendo, vão conseguir recolher, em quatro meses, o equivalente a 54% das armas recolhidas na primeira campanha que durou quase dois anos?
Essa nova campanha está fadada ao insucesso pelas seguintes razões:
O grosso das armas em mãos de cidadãos idosos influenciados pela algaravia apocalíptica do governo e de viúvas assustadas já foi recolhido. Eram, em sua grande maioria, cacos velhos sem nenhuma utilidade como arma. Quem tem uma arma em bom estado e ainda não a entregou não tem nenhum motivo pra fazê-lo agora; A maioria das armas recolhidas era de grandes centros urbanos; restam agora, majoritariamente, armas em áreas rurais. Essas armas são o único instrumento de defesa que o cidadão tem, morando a quilômetros de uma delegacia. Assim, ele não se preocupa com registro – que lhe custará um bom dinheiro – nem, muito menos, vai entregá-la. Alguém que mora em uma cidade longe de um posto de recolhimento necessita ir a uma delegacia de polícia, solicitar uma guia de trânsito, depois pegar um ônibus para ir ao local de entrega. Dependendo do local onde o cidadão more, ele vai gastar mais com passagens do que receberá (receberá?) do governo. A população não confia no governo, porque muita gente, ingênua o suficiente para confiar em promessas, entregou suas armas e não recebeu o pagamento (tenho uma pasta cheia de recortes de cartas de leitores reclamando por não ter recebido o pagamento por sua arma devolvida). Por uma questão de respeito aos cidadãos, o governo deveria dizer quanto pagou de indenização e quantos cidadãos ainda devem receber o prometido. E aqui reside o fato mais sério: recentemente renovei minha carteira de identidade. É inimaginável o grau de detalhes que você deve fornecer sobre sua vida, coisas como estado civil, nome da esposa, endereço, telefone e, pasmem, e-mail! Fica aqui a pergunta que eu e muita gente se faz: o que impede que amanhã outro congresso, prenhe de "brilhantes cabeças pensantes" como o atual, não resolva fazer uma lei obrigando que todas as armas registradas sejam entregues por seus proprietários à polícia? É só cruzar os dados da carteira de identidade com os do registro da arma e eles saberão exatamente quem tem e onde está a arma a ser confiscada. Quem garante, amigo leitor, que esta não é a estratégia do governo por trás dessa balela toda? Segundo o senador Renan Calheiros, que imagino bem informado, existiam no Brasil 20 milhões de armas (eu pessoalmente não acredito nesse número). Vamos assumir que cinco milhões sejam registradas de forma regular. Como foram recolhidas 550 mil, ainda existem 14,5 milhões armas irregulares. Retirar 300 mil, ou seja, 2% delas, vai resolver o problema ou é apenas mais um exercício de ilusionismo governamental? Para Tarso Genro, a redução das armas em circulação não resolve o problema da segurança pública no país, mas ajuda a conter a violência. Senhor Ministro, o que resolve o problema da segurança pública e ajuda a conter a violência é um eficiente trabalho de inteligência apoiado por um completo banco de dados. Apenas um exemplo: até hoje, o SUS não publicou o relatório anual Intitulado Óbitos por UF de Residência, referentes aos anos 2005, 2006 e 2007. Esse relatório é peça essencial para análise de mortes ocorridas no país. É preciso também que possamos contar com uma polícia bem treinada (segundo o jornal O Globo, policiais do Rio de Janeiro passam até dez anos sem serem treinados ou reciclados), bem paga e bem equipada. Um elemento chave é uma polícia de fronteiras eficiente, com contingente e recursos materiais compatíveis com a tarefa de fiscalizar nossas fronteiras terrestres. Ademais, é preciso falar grosso com o Paraguai e a Bolívia, em especial o primeiro, e dizer-lhes claramente que se eles não tomarem um providência nós vamos tomá-la (já vimos que carinho por essa gente não resolve o problema). Já que o senhor está preocupado com o .38 na mão do cidadão de bem, recomendo-lhe que leia a matéria publicada no Globo de 22/07/08, página 16, onde poderá esclarecer alguns fatos sobre a origem e calibres das armas usadas pelos traficantes cariocas, estas sim o verdadeiro perigo, que tudo leva a crer o senhor, embora Ministro da Justiça, desconhece. Já o exército do companheiro Evo Morales, para retribuir o carinho que o presidente do Brasil dedica ao povo boliviano, tem enviado para os morros cariocas metralhadoras .30, graciosamente decoradas com o brasão boliviano (O Globo, 04/08/08, página 10). Com menos armas em circulação, a tendência é que os riscos de bala perdida também diminuam, segundo o ministro. Aqui, o ministro bem que se esforçou, mas tudo o que conseguiu produzir foi uma meia verdade. Sim, doutor Tarso, menos armas significam menos balas perdidas. Lamentavelmente, o senhor só esqueceu de dizer que a maioria esmagadora das balas perdidas foram disparadas por armas de calibres exclusivos das forças armadas e das polícias civil e militar (e dos traficantes, naturalmente). Determine que se produza um relatório onde qualquer pessoa morta ou ferida por bala perdida tenha a munição que a atingiu coletada e identificada. O senhor vai então descobrir o que qualquer médico de pronto-socorro ou de Instituto Médico Legal está cansado de saber: que a maioria absoluta das vítimas foi atingida por munição calibre .223, .308, .40 ou 9 milímetros.
Há quatro anos estou fazendo um estudo baseado em notícia de jornais que pretendo publicar em breve. O estudo mostra que, do total de vítimas (só incluindo óbitos, não feridos), aqueles por "balas perdidas" (quando não se pode determinar a origem) representam 5,9% do total das ocorrências, enquanto mortes diretamente relacionadas a conflitos entre a polícia e a marginalidade, resultantes de ferimentos com calibres privativos, são 94,1%.
Portanto, responsabilizar cidadãos de bem por tragédias que têm como origem "bala perdida" é:
a) Ludibriar o contribuinte e
b) Não querer resolver o problema.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

PROJETO DE EMENDA À CONSTITUÇÃO DO ESTADO DE MINAS GERAIS CONFERE TRATAMENTO JURÍDICO MAIS ADEQUADO AO DELEGADO

Publico abaixo a proposta de Emenda Constitucional que encontra-se tramitando na Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais, conferindo tratamento mais adequado à carreira de Delegado de Polícia.

Parabéns aos nobres Deputados mineiros, autores da proposta!

Proposta de Emenda Constitucional semelhante poderia ser apresentado em nosso Estado.

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SUBSTITUTIVO Nº 1

Acrescenta o art. 273-A à Constituição do Estado.

A Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais aprova:

Art. 1º – A Constituição do Estado fica acrescida do seguinteart. 273-A:

“Art. 273-A – São estendidas aos Delegados de Polícia as garantias funcionais inerentes aos Defensores Públicos e aos Procuradores do Estado, definidas em lei específica”.

Art. 2º – Esta emenda à Constituição entra em vigor na datade sua publicação.

Sala das Comissões, 2 de outubro de 2007.
Fahim Sawan, Presidente - Ivair Nogueira, relator - WelitonPrado.

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PARECER PARA O 1º TURNO DA PROPOSTA DE EMENDA à CONSTITUIçãO Nº14/2007
Comissão Especial
Relatório
De autoria de 1/3 dos membros da Assembléia Legislativa e tendo como primeiro signatário o Deputado Sargento Rodrigues, a Proposta de Emenda à Constituição nº 14/2007 dá nova redação aoart. 273 da Constituição do Estado. Publicada no “Diário do Legislativo” de 27/4/2007, foi a proposição encaminhada a esta Comissão Especial para receber parecer no 1º turno, nos termos do art. 201, c/c o art. 111, I,“a”, do Regimento Interno.
Fundamentação
A proposição em análise tem por objetivo assegurar precisão técnica no tratamento constitucional oferecido à função de Delegado de Polícia. Parte, para tanto, de premissa segundo a qual o Delegado exerce função pública que se enquadra entre as carreiras jurídicas, especificamente a Defensoria Pública e a Advocacia do Estado. Do ponto de vista jurídico-constitucional a proposta não encontra óbice. Nos termos em que se apresenta, a proposta tão-somente reconhece a indubitável condição de carreira jurídica ao Delegado de Polícia, determinando que lhe sejam estendidos certos atributos funcionais, inerentes a essa circunstância. A nova redação constitucional inovará apenas na esfera de competência do Estado membro, na medida em que apenas estabelecerá determinada condição a ser observada quanto aos agentes que ocupam essa função pública. Da mesma forma, não violará reserva de iniciativa por via oblíqua, já que não trata, em concreto, de organização administrativa do Estado ou de regime jurídico do servidor. Trata, assinale-se, de reconhecimento formal em termos amplos e genéricos. A proposição se ocupa de propostas destacadas entre as mais importantes pelo grupo 4 e constantes do documento final do seminário legislativo “Segurança para todos”, realizado nesta Casa em 2006. Constam, pois, como itens prioritários, nºs 1 e 3 respectivamente, o “retorno do Delegado de Polícia às carreiras jurídicas” e a concessão de “garantias funcionais para os Delegados de Polícia nos mesmos moldes dos Defensores Públicos e Procuradores do Estado”. Trata-se de proposta que possui o claro objetivo de aprimorar a defesa social realizada em nosso Estado, especialmente o trabalho de investigação policial, mediante arranjo institucional que, se não é inovador, porque já aplicado em benefício da função pública desenvolvida por várias outras categorias, mostra-se apto a reformar de maneira eficaz o mencionado setor. A experiência brasileira é eloqüente ao evidenciar os casos da advocacia, da magistratura, do Ministério Público, da advocacia pública em geral, como alcançando seus mais elevados padrões de qualidade na medida em que seus membros, ponto central de suas atividades, passaram a ser suficientemente protegidos. Essa, aliás, a seara percorrida no trabalho acadêmico de Glória Bonelli, segundo a qual a equiparação do Delegado a essas outras categorias se enquadra em um contexto que prioriza a “profissionalização” do Delegado em benefício do serviço. Para a autora, “o percurso que os advogados, os magistrados e os Promotores de Justiça trilharam parece estar sendo seguido pelos Delegados de Polícia. Alguns dos desafios que enfrentam estão relacionados às especificidades de sua atividade, que articula dois mundos identitários distintos como o conhecimento técnico-científico e a prática da força, a valorização do saber abstrato e o desprestígio da violência e do trabalho 'sujo', o autocontrole das profissões e o risco imprevisível de lidar com a criminalidade” (Bonelli, Maria da Glória. “Os Delegados de Polícia entre o profissionalismo e a política no Brasil: 1842-2000”. In: “Meeting of the Latin American Studies Association”, Dallas,Texas, March, 27-29, 2003). Há o reconhecimento da posição do Delegado no rol das carreiras jurídicas (Mendonça, Paulo. “Introdução à Ciência do Direito”. In: http://www.unirio.br/ied) e esse enquadramentodecorre, especialmente, das funções a si atribuídas, as quais, para muito além de meras rotinas administrativas, demandam, inegavelmente, conhecimento da lei e raciocínio jurídico aguçado (Kfouri Filho, Abrahão José. "A Polícia Civil e sua institucionalização". In: “A Polícia Civil à luz do Direito”,Moraes, Bismael B. (org.). São Paulo: Revista dos Tribunais,1991). Transcreva-se, a propósito, a lição de Geraldo do Amaral Toledo Neto, Vice-Presidente da Associação dos Delegados de Polícia de Minas Gerais e professor de direito processual da PUC Minas, a respeito: “Tal como os membros da Defensoria Pública e da Procuradoriado Estado (Advocacia-Geral do Estado), órgãos da mesma derivação hierárquica, ou seja, do Poder Executivo mineiro, o cargo de Delegado de Polícia, como os citados, é privativo de bacharel emdireito, provido mediante concurso público de provas e títulos,com fiscalização direta da Ordem dos Advogados do Brasil, cabendo-lhe a interpretação e aplicação das espécies normativas que integram o ordenamento jurídico. Entre todos os agentes do Poder Executivo, apenas no concurso para essas três carreiras são exigidos tais requisitos, já que suas veredas necessitam de conhecimentos jurídicos para a operação de suas atividades”.(Toledo Neto, Geraldo do Amaral. “Manual de Processo Penal.Inquérito Policial. Ação Penal. Provas e Prisões”. Belo Horizonte:Ed. Ciência Jurídica, 2007). (Grifos nossos.) Perceba-se, ainda, a questão nas palavras do Delegado Roberto Brutus, que assim se expressou: “... Integramos o grupo das carreiras jurídicas. Participamos, no nascedouro, da apuração dos delitos. Formamos a prova. E fornecemos os elementos imprescindíveis à propositura da ação penal. É a polícia judiciária trabalhando contra a impunidade. Mais que isso. O Delegado de Polícia no dia-a-dia investiga, aconselha, dirime conflitos, evita o crime. Faz a paz. Regula, na verdade, as relações sociais” (In: Zaverucha, Jorge “Polícia Civilde Pernambuco: O Desafio da Reforma”. Recife: Editora UniversidadeFederal de Pernambuco, 2003). Como assevera Emanuel Lopes, com exatidão, a função de Delegado de Polícia inclui-se, a um só tempo, entre as de natureza policial e jurídica (“Carreira Jurídica ou Policial? Ambas”). Assim é que o reconhecimento de prerrogativas funcionais para o Delegado de Polícia, em isonomia com as demais carreiras jurídicas, a magistratura, a advocacia pública e a promotoria de justiça, é imperativo de racionalidade jurídica e de eficiência administrativa, afinal, não será com um Delegado de Polícia enfraquecido e à mercê de intervenções político-administrativas sobre o seu trabalho que o serviço policial se aperfeiçoará (Couto, Luiz Carlos. “O Delegado de Polícia está mais fraco, emtermos de poder e autoridade?” In: Jus Navigandi, Teresina, ano 2,n. 24, abr. 1998.). Normativamente, a definição de atividade jurídica é estabelecida pelo art. 2º da Resolução nº 11, de 31/1/2006, do Conselho Nacional de Justiça, que estabelece o seguinte: “Art. 2º - Considera-se atividade jurídica aquela exercida com exclusividade por bacharel em Direito, inclusive de magistério superior, que exija a utilização preponderante de conhecimento jurídico, vedada a contagem do estágio acadêmico ou qualquer atividade anterior à colação de grau”. Ora, do Delegado de Polícia são exigidos conhecimentos de direito constitucional, direito penal e direito processual penal, disciplinas empregadas pelo Delegado ao exercer valoração jurídica na análise do fato criminoso. Necessita, além disso, de conhecimentos de direito processual civil para efetuar buscas, arrestos e seqüestros; faz uso do Código de Trânsito para juridicamente decidir sobre direitos fundamentais da pessoa, como a cassação da Carteira Nacional de Habilitação ou a apreensão de veículos, obedecendo a procedimentos nos quais devem ser assegurados o contraditório e a ampla defesa; aplica conhecimentosde direito financeiro, econômico e fiscal no desempenho das atividades de repressão contra os crimes do colarinho branco;aborda o direito administrativo nos delitos praticados por funcionários públicos contra a administração publica,principalmente nos desvios de recursos do erário, nos casos de corrupção. Na esfera privada, exigem-se do Delegado conhecimentos de direito civil, para apuração de delitos contra a família, a propriedade, assim como questões agrárias, ambientais e decorrentes das relações de consumo. Recentemente, por exemplo, a nova Lei de Falências retirou a titularidade da apuração de delitos falimentares dos Juízes, entregando essa responsabilidadeao Delegado de Polícia, obrigando-o a aprofundar-se nos conhecimentos de direito comercial e empresarial. Segundo o Presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D’Urso, "a importância da presidência do inquérito ser realizada por um Delegado de Polícia não muda uma realidade, a carreira de Delegado de Polícia é muito árdua, muito difícil e apresenta sérias vulnerabilidades legais. Uma delas é a ausência de garantias constitucionais que justa e corretamente a magistratura e o Ministério Público ostentam e que os Delegados de Polícia deveriam obter" ("Aspectos do Inquérito Policial e Algumas Propostas”. In:www.mundojuridico.com.br). Frise-se que o enfraquecimento da polícia, mormente de seu agente mais importante, acompanha o estreitamento de atribuições e a falta de garantias de seus servidores, “de modo que a polícia além de ter suas atuações limitadas, quando as exerce, fica vulnerável a ingerências externas, em face da total ausência de garantias de seus dirigentes” (Xavier, Luiz Marcelo da Fontoura.“Uma reflexão sobre a atual situação da segurança pública e a atuação do Delegado de Polícia”. Jus Navigandi, Teresina, ano 7,n. 85, 26 set. 2003). Note-se, ademais, que, consoante Bonelli, os Delegados têm se distanciado de uma atitude de desinteresse em relação ao exercício funcional. Segundo a professora, “a própria origem social da amostra é predominantemente de classe média. Eles valorizam o diploma superior que obtiveram identificando-se com as carreiras jurídicas. A ênfase pragmática e antiteórica da polícia é mediada pelo discurso dos Delegados que destacam o caráter técnico-científico das investigações e a relevância do saber jurídico na condução do inquérito policial” (Bonelli, Maria da Glória. “Os Delegados de Polícia entre o profissionalismo e a política noBrasil: 1842-2000”. In: “Meeting of the Latin American StudiesAssociation”, Dallas, Texas, March, 27-29, 2003.). No mesmo trabalho, uma pesquisa aponta entre os principais obstáculos para a melhoria do trabalho policial, indicada por 57% dos entrevistados, “a instabilidade no exercício do cargo deDelegado”. Trata-se de admitir que ao Delegado de Polícia abre-se uma trajetória que, na história dos Juízes, começa a se consolidar ainda na década de 20, seguida pela dos membros do Ministério Público décadas depois, culminando com as garantias da Constituição vigente. Em um percurso no qual, tem-se até como pacífica hoje a necessidade da formação jurídica do Delegado, cuja defesa data de posicionamentos seculares, como o de Raul Soares, Delegado na primeira década do século XX e, posteriormente, Presidente de nosso Estado, cabe, agora, a inclusão do Delegado nas carreiras jurídicas e sua equiparação, em prerrogativas funcionais, às classes de agentes públicos que em importância a ela equivalem. Verifica-se, além disso, que a proposição em epígrafe encontra-se em harmonia com as propostas mais avançadas que estão em tramitação no Congresso Nacional, entre as quais se destaca a Proposta de Emenda à Constituição nº 549/2006, do Deputado Arnaldo Faria de Sá e outros, que "acrescenta preceito às Disposições Constitucionais Gerais, dispondo sobre o regime constitucional peculiar das Carreiras Policiais que indica”, aprovada na Comissão de Constituição e Justiça e em Comissão Especial na Câmara dosDeputados, com pareceres da lavra do conhecido jurista Régis de Oliveira, Deputado pelo Estado de São Paulo. Embora a proposição federal seja mais abrangente em seus termos, alcançando matéria que o constituinte derivado estadual não pode atingir, o fato é que a proposta em análise antecipa, na órbita estadual, parte dos avanços contidos na Proposta de Emenda à Constituição nº 549/2006. Ressalte-se, também, que nos termos previstos na proposição em exame, a matéria constituirá norma constitucional de eficácia contida, dependente de legislação infraconstitucional, que deverá regulamentá-la. Filia-se, nesse passo, à melhor doutrina, que desaconselha redação por demais minuciosa no texto constitucional,que, neste caso, se limitará a fixar princípios e diretrizes dotados de amplitude e plasticidade tais que ao legislador restaráo necessário complemento, adequado ao contexto no qual a norma se materializará. Um reparo formal, todavia, necessita ser realizado. É que a proposição objetiva alterar a redação do art. 273 da Constituição mineira, que foi revogado pelo art. 6º da Emenda à Constituição nº40, de 2000. Nos termos do art. 16 da Lei Complementar nº 78, de 9/7/2004, que trata da técnica legislativa, é vedado o aproveitamento de número ou de letra de dispositivo revogado. Deve-se, então, instituir novo artigo, usando-se a fórmula prevista no art. 15 da referida lei complementar, que impõe a adoção do mesmo número do artigo seguido de letra maiúscula. Verificamos, enfim, que a proposição em análise é meritória e atende aos requisitos jurídico-constitucionais que informam o tema, razão pela qual merece ser aprovada nesta Casa.
Conclusão
Em face do exposto, somos pela aprovação da Proposta deEmenda à Constituição nº 14/2007 na forma do Substitutivo nº 1, aseguir apresentado.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

PARA REFLETIR

“TUDO O QUE É NECESSÁRIO PARA O TRIUNFO DO MAL, É QUE OS HOMENS DE BEM NADA FAÇAM”.

EDMUND BURKE

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SOBRE O AUTOR:
Edmund Burke (1729 - 1797) foi um filósofo e político anglo-irlândes.
Advogado, dedicou-se primeiramente a escritos filosóficos dos quais destaca-se An Inquiry into the Origin of Our Ideas of the Sublime and the Beautiful ("Investigação filosófica sobre a origem de nossas idéias do Sublime e do Belo", 1757).
Iniciou carreira política em 1761
como primeiro-secretário particular do governado da Irlanda. Em 1765 foi nomeado secretário do Primeiro-Ministro e líder do partido Whig. Depois foi eleito para a Câmara dos Comuns, onde tornou-se conhecido por suas posições liberais.
Chegou mesmo a denunciar as injustiças cometidas pela administração inglesa na Índia
. No entanto, não podia aceitar facilmente os excessos da Revolução Francesa de 1789, expondo tais críticas na obra Reflexões sobre a revolução na França, de 1790.
Seus pensamentos foram expostos em cartas, discursos, panfletos e obras de circunstância. Expressa-se através de aforismos, por efusões líricas ou polêmicas, visando a maior parte das vezes um resultado prático.
Desprezava os filósofos franceses (em especial Rosseau
), que denomina "audaciosos experimentadores da nova moral".
Burke defendia a teoria do contrato social
e da soberania do povo. Afirmava que a história é feita de um longo depósito de tradições, de prudência, de moral, incorporadas aos usos e costumes das civilizações, e não de elaborações intelectuais, como querem os filósofos. Nessa mesma linha de raciocínio, Burke nega que as constituições possam ser feitas ou produzidas artificialmente. Para ele uma constituição só poderia surgir em decorrência da experiência, realidade e manifestação da vontade da maioria de um determinado povo. Somente assim seria duradoura.
Burke se opõe à Revolução Francesa, porque a considerava um edifício erguido em bases frágeis. Para ele a Constituição Inglesa
era mais sábia, porque não se fundava apenas em um certo universo de regras e princípios gerais, mas em uma vasta e sutil harmonia de costumes e de instituições que foram estruturados ao longo do tempo.
Essa antítese sobre as duas Constituições é o pano de fundo para que Burke desenvolva sua filosofia sobre o conservadorismo. É considerado o pai do pensamento conservador anglo-americano.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

A APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ERGONOMIA NO TRABALHO POLICIAL

Qualquer Delegado de Polícia que tenha efetivamente desempenhado suas funções nos plantões das delegacias de São Paulo e interior, ou pelo menos assumido a presidência de centenas ou milhares de inquéritos policiais por alguns anos, é capaz de apontar sem pensar muito, uma rápida listinha de ingredientes para ter problemas, ainda que tenha agido na mais absoluta boa-fé.
Para quem trabalha há anos é mais fácil prever o que pode dar errado, seja por bom senso, observação da realidade, ou porque testemunhou ocorrências que se converteram em problemas de toda espécie e proporção, com graves conseqüências para o responsável pelas decisões.
Em tempos modernos, contudo, é muito antiquado considerar que o conhecimento efetivo da prática da atividade policial tem alguma importância. Há uma certa presunção de que o policial, incluindo o delegado de polícia, não tem lá muito o que dizer sobre o seu próprio trabalho, ou porque é intelectualmente despreparado ou porque, sendo policial, é necessariamente suspeito de algum defeito, como desonestidade, truculência, burrice etc.
Todos parecem saber mais que o delegado de polícia sobre seu trabalho, incluindo alguns de outras carreiras policiais, sem falar de membros de outras instituições, políticos, advogados, sociólogos, economistas, jornalistas e colunistas sociais etc.
Não há dúvidas de que profissionais de outras áreas têm contribuições relevantes e úteis para aprimorar a polícia judiciária. Cada vez mais se sabe que a interação entre as variadas áreas do conhecimento é fundamental para o desenvolvimento de qualquer sistema, especialmente numa área que, além do conhecimento jurídico, exige-se o domínio de técnicas multidisciplinares.
O verdadeiro estudioso jamais avalia a pertinência de uma idéia tão somente com base nas credenciais de quem a apresentou, mas sim é capaz de refutá-la ou corroborá-la com argumentos próprios.
Se é preciso admitir, como condição si ne qua non de melhoria, que as discussões sobre a polícia judiciária e a segurança pública não sejam tratadas pelos profissionais da área como um jogo privativo dos seus membros, necessariamente a contribuição destes não pode ser tratada com desconfiança ou mera consideração educada, típica de quem se acredita superior, mais pela beleza dos títulos do que pela força das idéias.
O estudo da lingüística nos mostra que há algum tempo que as palavras antigas, já sacramentadas pela boa técnica ou pelos usos e costumes, vem sendo substituídas por outras mais novas e frescas, mais aptas a serem levadas a sério ou a causarem o impacto político desejado, apenas porque representam a idéia de algo inovador. Assim como as palavras, novos estudos criam conceitos novos, ora para revolucionar idéias, ora para dar nova roupagem às antigas.
Alguns destes termos parecem mesmo ter conquistado a simpatia das platéias, porque o simples emprego dessas palavras já confere ao discurso maior elegância e credibilidade, ainda que tenham sido proferidas em total descompasso com seu verdadeiro significado.
É com certa curiosidade que se observa a prevalência de discussões sobre “gestão”, “estatísticas” e “metas” sobre outras questões mais imediatas, tais como consertar a viatura quebrada ou mesmo proporcionar aos policiais rádios, computadores e telefones que funcionem.
Mais importante do que criticar o uso inadequado das palavras da moda é entender o que significam e aplicar os princípios que com elas tiverem pertinência. Se as idéias forem discutidas no lugar das palavras e dos títulos, policiais, economistas, médicos e administradores facilmente perceberiam como concordam em muitos aspectos e como o conhecimento de cada qual contribui para a formação de um sistema eficiente.
Neste contexto, vale a pena conhecer os princípios da ergonomia, porque, para aqueles que não sabem, o termo significa muito mais do que cadeira confortável para trabalhar sem ficar com dor nas costas.
Ergonomia ou Fatores Humanos é a ciência que estuda a relação entre os seres humanos e outros elementos de um sistema.
A função dos ergonomistas é aplicar vários conhecimentos teóricos, princípios e métodos para desenvolver projetos capazes de melhorar o bem-estar humano e o desempenho geral de um sistema, contribuindo para o projeto e avaliação de tarefas, trabalhos, produtos, ambientes e sistemas, a fim de torná-los compatíveis com as necessidades, habilidades e limitações das pessoas.
As aplicações são várias, porque a ciência é multidisciplinar, englobando aspectos relacionados a diferentes cursos, como medicina, fisioterapia, engenharia de produção, desenho industrial, psicologia etc.
A Associação Internacional de Ergonomia divide a ergonomia em três áreas: Ergonomia física, ergonomia cognitiva e ergonomia organizacional.
A Ergonomia Física estuda as respostas do corpo humano à carga física e psicológica. Aqui cabe o exemplo da tal cadeira ergonômica, adaptada ao usuário do computador.
A Ergonomia Cognitiva, conhecida como engenharia psicológica, diz respeito aos processos mentais, tais como percepção, atenção, controle motor e capacidade de memória. Aplicações importantes: carga mental de trabalho, vigilância, capacidade de tomar decisões, interação humano-computador e treinamento.
A Ergonomia Organizacional ou macroergonomia estuda a estrutura do sistema de trabalho no sentido mais abrangente, quanto à organização do sistema, ao estabelecimento de políticas e processos relacionados à execução do trabalho. Exemplos de aplicação prática: Divisão do trabalho em turnos, programação das tarefas a serem executadas, formas de gerar maior satisfação pessoal nos trabalhadores, motivação, supervisão, aperfeiçoamento do trabalho em equipe, de trabalho à distância e ética.
Qualquer trabalho realmente sério de gestão na polícia precisa considerar, e muito, todos os aspectos referentes à ergonomia, porque o objetivo final é a melhoria de todo sistema, de modo a otimizar a produtividade e alcançar uma prestação de serviço de qualidade, sem olvidar da melhoria nas condições de salubridade e segurança no meio ambiente de trabalho do policial.
Há vários sistemas complexos, mas as questões referentes à polícia judiciária e à segurança pública estão entre as mais complexas de todas, porque envolvem, além do controle social que qualquer país precisa, risco efetivo para a vida e a saúde dos profissionais e de todos os envolvidos.
Todos policiais trabalham armados e a maioria é obrigada a cumprir turnos de plantões durante muitos anos. Há quem aposente após desempenhar suas atribuições exclusivamente em plantões, ou seja, trabalhando décadas em turnos ininterruptos de plantões.
Este policial armado encara anos de plantões noturnos, por vezes com horários dobrados de 12, 24 e até 48 horas, sem que haja qualquer preocupação administrativa com o limite de sua carga horária diária ou semanal. Parece não haver qualquer preocupação com os limites necessários de horário de trabalho, como condição admissível para um bom desempenho dessa atividade de alto risco, em que um erro pode significar graves prejuízos aos policiais e aos destinatários de seus serviços.
A essa altura, alguns questionamentos são inevitáveis:
Quantos anos alguém pode trabalhar em plantões sem perder a saúde e o sono? Alguém perguntou aos médicos? Como vai se comportar um policial armado na 12ª hora seguida de plantão noturno? Conseguirá proteger a si próprio e as pessoas que estiverem ao seu redor com a mesma presteza? Qual a chance deste policial exausto errar? Quem suportaria o preço do erro?
Podemos indagar, ainda:
Quais os equipamentos realmente necessários para o trabalho do policial plantonista? Quantos policiais são necessários para garantir o bom atendimento da população dentro de parâmetros razoáveis de segurança? Como gerar motivação nestes policiais? Como garantir-lhes a manutenção da saúde, para que tenham a capacidade de decidir questões complexas em poucos minutos e para que possam desenvolver um trabalho de qualidade ao longo de sua vida profissional?
Como estruturar equipes de policiais que vão atuar na continuidade das investigações inicialmente atendidas nos plantões? Quais softwares são mais úteis à polícia? Quais são necessários ao perito, ao delegado ao investigador? Como deve ser a preparação, treinamento e reciclagem de delegados, escrivães e investigadores?
Se ainda não se sabe como fazer, é certo que qualquer policial sabe como não fazer.
Regimes de plantões sem fim até a velhice sem alternância com trabalho em horário de expediente, trabalho por horas e horas a fio sem alimentação adequada, pouco descanso, ausência de salas de repouso nos distritos, cargas horárias superiores a 40 horas semanais, funcionários cansados e desmotivados, sem perspectiva alguma de promoção ou melhoria das condições de trabalho, horas e horas dedicadas a “bicos” para a complementação de renda, diligências cumpridas em viaturas danificadas ou sem manutenção adequada, com rádio quebrado, sem equipamentos suficientes de segurança, dentre outras questões que comprometem a segurança do exercício da atividade policial. Os exemplos encheriam páginas e páginas.
Os ergonomistas ficariam arrepiados. Diriam que a organização do sistema é ineficiente e inadequada e que o sistema está falido, fadado ao fracasso.
Qualquer policial experiente, com mais ou menos estudo, diria de forma menos elegante: VAI DAR PROBLEMA.
Se as idéias forem consideradas mais importantes do que as palavras ou as expressões da moda que as definem, poderemos ter chance de, quem sabe, algum dia, quando alguém parar para enfrentar os problemas e realizar estudos realmente sérios a respeito, conquistarmos um sistema realmente melhor e eficiente de polícia judiciária e de segurança pública.
Autor: Emanuel M. Lopes, Delegado de Polícia e Mestre em Direito.

MUDANÇAS NÃO OCORREM SEM COMPROMETIMENTO DA SOCIEDADE

Para que possa haver melhoria da Segurança Pública e do Sistema de Justiça Criminal como um todo é preciso que haja maior comprometimento da sociedade, em especial da comunidade jurídica. É preciso ouvir quem trabalha na área - os especialistas de fato - que podem dar grande contribuição.
A reportagem publicada abaixo demonstra a que ponto pode chegar a criminalidade, quando seus problemas não são estudados e levados a sério. Tanto lá (México) como cá, muitos são os discursos hipócritas, vazios, eleitoreiros e oportunistas, mas poucas são as ações efetivas para mudar.
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03/09/2008
Mexicana captura sozinha os seqüestradores de seu filho
Maite Rico
Em Madri
O pesadelo de Isabel Miranda começou em 12 de julho de 2005, quando seu filho, Hugo Wallace, de 30 anos, não compareceu a um encontro familiar. As ligações para seu celular não tinham resposta. Sua casa estava vazia e em ordem. Na noite anterior, Hugo havia dito a uma amiga que ia ao cinema com uma "nova namorada". Ali foram em busca de pistas. O estacionamento estava vazio. Percorreram sem sucesso hospitais e centros de emergência. "Então fiquei louca", diz Isabel. A Cidade do México encabeça os seqüestros no mundo, e Hugo era um próspero empresário: a família temeu o pior.
Isabel conseguiu que a companhia telefônica lhe desse a lista de chamadas para o celular de seu filho. A última havia chegado às 21h20 de 11 de julho. Localizaram a antena e sobre um mapa dividiram os bairros em um raio de 6 km, a área de cobertura. "Meu sobrinho encontrou o carro de Hugo no bairro Insurgentes. Estava mal estacionado. Ao vê-lo, comecei a chorar."
Um vigilante lhe disse que "uma mulher alta, bonita, de seios grandes" tinha estacionado ali. Morava em frente, na rua Perugino, 6, apartamento 4. Tocaram a campainha quando um menino saiu na portaria. "Agora não vão querer abrir, porque houve um problema, desceram com um rapaz ferido", disse.
Espantada, Isabel chamou a polícia. "Em vez de ajudar, não nos deixaram entrar no edifício. Colocavam obstáculos para tudo, como se protegessem alguém."
Nesse momento a vida dessa pedagoga de 58 anos mudou. Apresentou uma denúncia por seqüestro, deixou seu trabalho e se dedicou somente à busca do filho, com a ajuda de irmãos, sobrinhos e cunhados. Durante duas semanas vigiavam a casa em turnos de 12 horas. "Não sabíamos quem estávamos procurando. Pedi em vão uma ordem de busca. Um dia trocaram o carpete. Chamamos a polícia. Nunca veio."
Nesse tempo falaram com os moradores, os coletores de lixo, a mulher da barraca de tortilhas... Conseguiram saber que nesse lugar vivia uma jovem e seu namorado, um sujeito mal-encarado que se gabava de ser da polícia. Ela era dançarina do grupo Clímax, do estado de Vera Cruz. Fazendo-se passar por secretária de uma empresa interessada em contratar o grupo, Isabel conseguiu os dados e a foto de seu alvo, Hilda González. E a localizou no outro lado do país, em Jalisco.
Isabel não largou mais sua presa, que pouco depois voltou à capital. Então a família Wallace tinha recebido uma foto de Hugo, jogado no chão e com os olhos vendados. Os seqüestradores exigiam 950 mil pesos.
Isabel decidiu enviar para fora do México seu marido, um contador aposentado com problemas cardíacos, e sua outra filha. Não queria mais preocupações. A partir de Hilda, seguiu a meada e foi armando o quebra-cabeça. Disfarçada com perucas e enchimentos, rastreando, comprando vontades. "Aprendemos no ato, com criatividade", diz. Seu irmão e um advogado amigo foram seus escudeiros. Na semana seguinte identificaram o namorado de Hilda: César Freyre, policial do estado de Morelos.
Em novembro se interrompeu o contato com os seqüestradores. Em 10 de janeiro de 2006, depois de algumas tentativas fracassadas, a Polícia Federal finalmente deteve Hilda. Freyre caiu duas semanas depois. A própria Isabel o capturou. "Meu irmão e eu nos colocamos perto do restaurante onde trabalhava sua amante. Uma noite, ao acabar a jornada, ela pegou um táxi. A seguimos até onde César Freyre a esperava." Ao vê-los, Freyre sacou uma pistola, mas Isabel e seu irmão se jogaram em cima dele e o derrubaram. "Foi uma inconsciência. Não nos matou porque Deus é grande."
A trama seria novelesca se não fosse pelo fato de que o corpo esquartejado de Hugo Wallace jaz hoje em algum lugar da cidade. "O mataram na mesma noite do seqüestro. Hilda confessou tudo. Meu filho ficou violento e o golpearam. Exageraram nos golpes." Lavaram o corpo e tiraram fotos para pedir o resgate. Depois o cortaram com uma serra elétrica e desceram os pedaços em sacos de lixo.
Então, sim, a polícia revistou o apartamento da rua Perugino. Nele encontraram a carteira de motorista de Hugo e manchas de sangue do jovem. "Sete meses depois do seqüestro? Nós tínhamos encontrado a casa no dia seguinte!", suspira a mãe.
Tão aterrorizante quanto o panorama que oferecem as estatísticas de seqüestros no México: 564 em 2005; 608 em 2006, 789 em 2007, mais de 500 este ano. Esses são só os denunciados. Em termos reais, o número triplica. O México é hoje o primeiro país em seqüestros, acima do Iraque. Um país onde há 1.600 corpos policiais diferentes e descoordenados, e legislações diferentes nos estados. Onde 98% dos crimes ficam impunes e no qual morreram este ano 3 mil pessoas nas mãos do narcotráfico.
A rotina de violência oferece tais episódios de brutalidade que ainda é capaz de horrorizar a sociedade mexicana, como a descoberta na última quinta-feira de 12 corpos decapitados em Yucatán. As autoridades informaram sobre a detenção de três suspeitos.
Com a descoberta das manchas de sangue de seu filho, o caso apenas começou para Isabel. Hilda deu os nomes dos cúmplices: Jacobo Tagle, Brenda Quevedo, os irmãos Alberto e Tony Castillo Cruz.
Nessa época a capital mexicana ficou cheia de anúncios gigantes com os rostos dos membros do bando, sob a legenda de "seqüestrador e assassino" e uma recompensa em troca de informação. No verão de 2006, os rostos dos criminosos dividiam espaço com os retratos sorridentes dos candidatos presidenciais, em plena campanha eleitoral.
Todos foram caindo, um a um. A pista de Brenda foi seguida até os EUA. O FBI a deteve em novembro passado no Kentucky. Agora está à espera da extradição. Só falta Jacobo Tagle. "Deve estar em Israel. Sua família é de lá e não há acordo de extradição."
"Nós fizemos todo o trabalho. Alguns funcionários me ajudaram, é verdade. A promotoria nos apoiou. Mas a polícia não fez nada", conta Isabel. Pelo caminho localizaram outras quatro vítimas de Freyre, que se somaram ao processo. Descobriu o cadáver de um comparsa do bando, assassinado por seus cúmplices. E revelou as conexões entre o grupo e agentes policiais de Morelos e da capital.
Isabel enfrenta uma denúncia por tentativa de seqüestro e outra por "sujar o bom nome" de Freyre em anúncios espetaculares. Nada importante, comparado com a tentativa de atentado que sofreu há apenas dois meses, quando homens dispararam contra seu carro.
"Não vou parar até encontrar os restos de Hugo. E até ver Jacobo Tagle entre as grades." Hoje ela ajuda outras pessoas e dá conferências. E promoveu com outras organizações a grande marcha de ontem na capital, com dezenas de milhares de participantes. "Não é uma marcha a mais. É o início das mudanças de que precisamos. O que acontece conosco não é só problema das autoridades. Também tem a ver conosco como cidadãos." Outras 70 cidades do país e oito do exterior, entre elas Madri, também tiveram manifestações.
Isabel mostra-se cética diante do recente Acordo pela Segurança assinado por todos os poderes do Estado. "Não creio no discurso político. Há oito anos dizem a mesma coisa. Não haverá mudanças sem nós."

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

A APOSENTADORIA ESPECIAL É UM DIREITO DO TRABALHADOR POLICIAL

Publico abaixo mensagem recebida de um policial civil do Estado do Paraná reclamando das medidas legais que estão sendo tomadas em prejuízo de policiais já aposentados. A insegurança jurídica deste país é algo impressionante. Temos uma lei perfeitamente legal, que foi recepcionada pela Constituição da República, mas que não está sendo aplicada, trata-se da Lei Complementar 51 de 1985. No caso concreto aqui narrado, parece-me que ignoraram que havia um ato jurídico perfeito e o direito adquirido dos policiais aposentados, que agora devem aguardar em atividade um julgamento que pode se arrastar por anos e anos.
Enquanto isso, o Congresso Nacional, que poderia resolver o problema facilmente, editando nova lei que impedisse qualquer dúvida ou questionamento legal sobre esse legítimo direito, omite-se, propiciando a prática dessas injustiças e do tratamento desigual entre policiais civis e o dado aos militares.
Informo aos interessados que todas as decisões judiciais que possuo a respeito estão publicadas no http://precedentesjudiciais.blogspot.com .
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APOSENTADORIA ESPECIAL DO POLICIAL CIVIL
Dr.Emanuel,
Sou de Curitiba, Paraná. Tenho 49 anos de idade. Estou lutando contra tudo e contra todos para conseguir manter-se aposentado definitivamente.Sou policial civil (Investigador de Polícia - 1ª Classe) aqui em Curitiba. Contribui 30 anos para o Estado e trabalhei por 25 anos e 05 meses como policial civil, em DPs, Delegacias Especializadas, enfim, na carreira estritamente policial, bem como, fui PM por 3 anos e 3 meses.Desses 30 anos, somente 1 ano e 4 meses de iniciativa privada.Como outras centenas de companheiros, estamos tendo nossa aposentadoria NEGADA pelo Tribunal de Contas do Paraná, que, em 2006 fêz uma "uniformização de jurisprudência" esdruxúla a qual deram o nome de Acórdão 1421/06. Por esse acórdão o policial só se aposenta se cumprir os 30 anos de contribuição e os 20 anos na função estritamente policial (ambos requisitos da LC 51/85) mais idade mínima de LC 20/98 + a LC 41/03 e + a LC 47 não sei de que ano. Resumindo só vai embora se tiver 60 anos de idade. Pegaram regras de idade mínima da aposentadoria da iniciativa privada, da última reforma da previdência, misturaram com a LC 51/85 e fizeram uma salada indigesta, mortífera.Todo o processo de aposentadoria que o Estado concede em conjunto com o órgão previdenciário quando chega no Tribunal de Contas é analisado à luz desse Acórdão e NEGADO O REGISTRO DA APOSENTADORIA, com uma intimação para o Estado em no máximo 15 dias fazer o policial civil voltar ao trabalho. Com isto, eu que estava aposentado há (08) oito meses fui chamado à ativa, bem como, outros companheiros que, pasme, estavam aposentados havia 2,3,4 anos. Um verdadeiro absurdo. E o mais absurdo é que aqueles que ingressaram na Justiça aqui do Estado com Mandado de Segurança, não estão sequer conseguindo liminar para permanecer aposentado. Quando conseguem como foi meu caso, não dura 30 dias, pois, olha o absurdo, quando citado pela Justiça o Estado entra com agravo regimental dando sua versão para o caso e pedindo ao Desembargador que casse a liminar do policial. E, claro, como são tudo farinha do mesmo saco, eles caçam a liminar. Resumindo: Não soube de ninguém que tenha ganhado a causa. O julgamento do mérito se acumulam dia a dia. Estão parados, inertes não andam. Cassam a liminar ou denegam e o policial se obriga a voltar a trabalhar e o mérito não é julgado. Com isso não podemos recorrer ao STF. Tudo jogo de carta marcada. O que me entristece é ver o Estado te conceder a aposentadoria, inclusive, com publicação em Diário Oficial e depois correr na Justiça pedindo para cassar a liminar que te deixaria pelomenos aposentado até julgamento do mérito.Olha nem tenho palavras para descrever o descaso, o descalabro e a agrura que estamos passando.Tudo isso, porque um órgão que não tem competência para legislar, está legislando que é o TCE.Tudo isso porque a Justiça é cega e não vê o que esse Tribunal está fazendo: Fazendo prevalecer um acódão sobre uma Lei Complementar Federal que é a 51/85. A Justiça aqui viajou no acórdão do TCE e não determinou a ilegalidade desse Acórdão. Então, Doutor, minha única e última esperança será no SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
Lendo essa materia no seu site:
Peço ao senhor, encarecidamente, que me conseguisse o número do processo deste policialpara eu consultar no STF e usar como argumento no meu recurso. Enfim, qualquer outro material sobre esse assunto que o senhor conseguir, será de grande valia para minha advogada fundamentar, em breve, o meu recurso que farei no STF.Desde já agradeço qualquer ajuda que possa me dar e coloco-me ao seu dispor para qualqueresclarecimento ou dúvida.
Nome: Dalton Anotnio Monteiro Piotto.
Curitiba - Paraná

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

ALGEMAR OU NÃO ALGEMAR? EIS A QUESTÃO.

PUBLICO ABAIXO O MAIS BRILHANTE ARTIGO QUE LI ATÉ AGORA SOBRE A POLÊMICA CRIADA ENTORNO DO USO DAS ALGEMAS.
COMO SE VÊ, ÀS VEZES A FORMAÇÃO JURÍDICA ATRAPALHA NA COMPREENSÃO DE ALGUMAS QUESTÕES, QUE DEPENDEM APENAS DE BOM SENSO.
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Folha de São Paulo, 24 de agosto de 2008.
DANUZA LEÃO
Sobre as algemas
Duvido que um batedor de carteira vá ser avaliado, em uma fração de segundo, se deve ou não ser algemado
Tem coisas que só no Brasil: essa discussão sobre as algemas, por exemplo. O intrigante é que só tenham pensado nisso depois da prisão de Daniel Dantas, Naji Nahas e Celso Pitta. Em todos os países do mundo, quando um "indivíduo" vai preso, ele é algemado, discretamente, com as mãos nas costas, e fim de papo; mas limitar o uso das algemas apenas para casos de "resistência, perigo de fuga ou perigo à integridade física própria ou alheia", e ainda obrigar o agente a justificar, por escrito, a razão que o fez optar pelas algemas é um total absurdo. Na hora de prender alguém, os ânimos costumam estar exaltados, e em uma fração de segundo a pessoa mais dócil e tranqüila pode se transformar numa fera, agredir o policial que o está prendendo e fugir para não ir para a cadeia. É bem verdade que de pessoas finas não se espera esse tipo de procedimento, até porque essas sabem que têm bons advogados que conseguirão libertá-las em curto tempo. Nenhum ser humano é perfeito, isso é um fato. E o policial? Mesmo que seja advogado, psicanalista e um profundo conhecedor da condição humana, ele pode falhar. Mas e se falhar? Como justificar, por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal, que percebeu no brilho do olhar de quem estava prendendo, que ele seria capaz de qualquer coisa para escapar da prisão? E se tiver um canivete no bolso que ninguém tenha visto, não pode atacar o policial e até matá-lo?
Como um agente, que ganha uma miséria, pode ficar sujeito às penas da lei, desde que essa responsabilidade passou a ser dele? Todo mundo pode se enganar, sobretudo em situações de tensão, como é o caso no momento de uma prisão. Mesmo os mais inteligentes, os mais preparados, as mentes mais cultas podem se enganar -e se enganam muitas vezes, durante o decorrer de suas vidas. Enganam-se quando amam a pessoa errada, se enganam quando educam seus filhos, pensando que estão fazendo o melhor e ele se torna um traficante. Daí o ditado: errar é humano. Mas o pobre do policial não pode errar; tem que ter certeza, naquele instante, de que a pessoa que está prendendo não vai fugir, que não vai ferir sua integridade física etc. etc., ou será punido. É querer muito. Ou se algema todo mundo, ou não se algema ninguém. Duvido que um batedor de carteira vá ser avaliado, em uma fração de segundo, se deve ou não ser algemado. Mas duvido mesmo. E não há prova maior de que, por mais autoridade e conhecimento de vida que tenha uma pessoa, ela sempre pode se enganar. Vide o caso -com todo o respeito- do brilhante ministro Marco Aurélio Mello, que concedeu habeas corpus a Salvatore Cacciola, certo de que, por ter domicílio fixo, família etc., ele não iria jamais tentar fugir; pois 24 horas depois o banqueiro tomou um avião e foi parar na Itália, onde ficou livre durante oito longos anos. Se um dos mais inteligentes ministros do Supremo Tribunal Federal pode cometer um engano desses, como pretender que um simples policial tenha, em minutos, a certeza absoluta sobre quem deve ou não ser algemado? A partir de agora, quem for rico e tiver apenas roubado -e quanto mais melhor- pode ficar tranqüilo, pois não será, jamais, algemado. Mas toda a opinião pública saber, pelos jornais e pelas televisões, dos crimes que eles cometeram é tão vergonhoso como ter uma foto nos jornais com algemas nos pulsos. As algemas, aliás, são o de menos.

danuza.leao@uol.com.br

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

A LEI DEVE SER CUMPRIDA SEM ESPETÁCULO


Caderno da Cidadania

LEI SECA
Bafômetro sim, mas sem a mídia
Por José Paulo Lanyi em 7/8/2008
O desembargador José Damião Pinheiro Machado Cogan, integrante do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), concedeu na tarde de quinta-feira (7/8) uma liminar que proíbe a polícia paulista de realizar os testes do bafômetro com exposição dos motoristas ao público e a equipes de reportagem.
Escreve o desembargador em sua decisão, à qual este Observatório teve acesso em primeira mão:
"O que se tem observado nos meios de comunicação é que se transformou a fiscalização, que deveria ser regular e discreta, em verdadeiros espetáculos dirigidos à mídia, onde se filma e fotografa aqueles que estão se submetendo ao exame do etilômetro, violando dessa forma a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação."
A liminar foi concedida em razão de um pedido de habeas corpus preventivo impetrado pelos advogados Fábio Leugi Franzé e Eriton da Silva Scarpellini contra o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Ronaldo Marzagão, o comandante geral da Polícia Militar, coronel Roberto Antônio Diniz, e o delegado geral da Polícia Civil, Maurício Freire.
Os advogados queriam evitar que, caso se recusassem a se submeter ao exame do bafômetro, sofressem as sanções previstas na lei – como multa, apreensão do veículo e proibição de dirigir por 12 meses.
No pedido do habeas corpus, os advogados argumentaram que, de acordo com a Constituição federal, nenhum cidadão é obrigado a produzir provas contra si.
Decisão provisória
A liminar não proíbe a realização dos testes, mas determina que sejam feitos "com discrição":
"Fica concedida em parte a medida liminar para que o Exmo. Sr. Secretário da Segurança Pública determine que a Polícia Militar e a Polícia Civil, no submeter a exames de etilômetro motoristas suspeitos de estarem alcoolizados, o faça com discrição, de preferência em local próximo e reservado, como no interior de uma viatura do tipo base comunitária, por exemplo, sem a presença de público em geral ou integrantes dos meios de comunicação, que ficam proibidos de filmar ou fotografar aqueles que se submetam a referido exame, mesmo nas delegacias de polícia".
As autoridades da Segurança Pública terão 48 horas para prestar informações à Justiça e esclarecer como estão sendo cumpridas as mudanças do Código Nacional de Trânsito em conseqüência da chamada "Lei Seca". Deverão informar, também, se tomaram as providências determinadas pelo tribunal.
A decisão, portanto, é provisória. O julgamento do mérito deverá ocorrer em cerca de 30 dias.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

FALTA DE GARANTIAS CONSTITUCIONAIS COMPROMETE INDEPENDÊNCIA INSTITUCIONAL

A falta de garantias constitucionais para o exercício das atribuições de Delegado de Polícia compromete a independência da instituição.
É importante entender que o Delegado-Geral e os Diretores da instituição também não possuem qualquer garantia de permanência no cargo de confiança que ocupam. Portanto, são demissíveis "ad nutum", ou seja, a qualquer momento, sem necessidade de qualquer justificativa, em razão da natureza política dos cargos que ocupam.
Os Delegados de Polícia que não exercem cargos de confiança somente poderiam ser removidos com o cumprimento das regras contidas no artigo 140, parágrafo 3º, da Constituição do Estado de São Paulo, nos seguintes termos:
"Art. 140 - A polícia Civil, órgão permanente, dirigida por delegados de polícia de carreira, bacharéis em direito, incumbe, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
Parágrafo 3º - A remoção de integrante da carreira de delegado de polícia somente poderá ocorrer mediante pedido do interessado ou manifestação favorável do Colegiado Superior da Polícia Civil, nos termos da lei".
Portanto, conforme se pode verificar, a remoção deve ocorrer por pedido do interessado.
Ressaltamos que a lei não faz menção a pedido do Delegado-Geral ou a pedido do Diretor, mas a pedido do interessado.
Quando não se tratar de remoção à pedido do interessado, estaremos tratando de remoção compulsória, com caráter punitivo, portanto sujeita aos princípios do contraditório e da ampla defesa, que devem preceder a manifestação do Conselho Superior.

domingo, 3 de agosto de 2008

SEM POLÍCIA JUDICIÁRIA INDEPENDENTE NÃO SE FAZ JUSTIÇA


São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2008

Protógenes critica falta de independência da polícia

Lula Marques/Folha Imagem
Protógenes Queiroz, delegado da Polícia Federal que comandou caso Dantas, durante entrevista em seu apartamento em Brasília
Para delegado, organizações criminosas têm estrutura para entrar no aparelho estatal.
Afastado da Satiagraha menos de uma semana após prisões de banqueiro e de investidor, ele afirma que delegados estão fragilizados
RUBENS VALENTE
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

Primeiro num táxi e, depois, em sua casa, um apartamento alugado onde vive desde 2003 na capital, o delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz, 49, concedeu a primeira entrevista desde que deixou o comando da Operação Satiagraha. Disse, desde os contatos iniciais para a realização da entrevista, que não falaria sobre o conteúdo do inquérito nem sobre outros pontos da operação, alegando o dever de zelar pelo sigilo da investigação. Mas fez várias alusões, veladas ou indiretas, ao caso.O inquérito que embasou a Satiagraha levou à prisão, por duas vezes, o banqueiro Daniel Dantas, solto em ambas as vezes por ordem do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Gilmar Mendes. Também foram presos -e depois soltos- o investidor Naji Nahas e o ex-prefeito Celso Pitta, entre outros acusados.Em documento protocolado na Justiça Federal, Protógenes, afastado do caso pela cúpula da PF -ou "a pedido", segundo a versão oficial-, disse ter havido "tentativa de obstrução" do trabalho por delegados da direção geral do órgão. Também citando a questão do sigilo sobre os autos, ele não comentou, na entrevista, motivos que o levaram a fazer a queixa à Justiça.O delegado defende a autonomia da PF, tema de um projeto de emenda constitucional que tramita no Senado. Segundo ele, os delegados hoje estão "expostos" e "fragilizados" e precisariam ter garantias de permanência no cargo durante as investigações.


FOLHA - O trabalho da PF está vulnerável a interferências e pressões externas?

PROTÓGENES QUEIROZ - A PF não tem a prerrogativa da inamovibilidade, como têm o Ministério Público, o Judiciário. O juiz que começou uma ação tem essa prerrogativa. Nenhum superior hierárquico pode querer tirá-lo do caso.


FOLHA - O delegado fica exposto?

QUEIROZ - Sim, muito exposto, muito fragilizado. A polícia não é uma instituição independente, faz parte do Poder Executivo. Se tivesse independência, haveria mais segurança para a autoridade investigar. E fortaleceria até a imparcialidade.

FOLHA - Essa independência já não existe?

QUEIROZ - De maneira nenhuma. Agora mesmo, devido a razões que não posso manifestar, em relação à Operação Satiagraha, verificou-se a necessidade de a autoridade policial ter independência funcional. Isso vale principalmente nas investigações que envolvem corrupção nos órgãos do poder estatal.

FOLHA - Por quê?

QUEIROZ - Certas organizações criminosas hoje possuem estrutura e poder para colocar determinados criminosos no vértice do aparelho estatal. É o que nós estamos vendo no quadro aí. O próprio processo eleitoral fica comprometido com candidatos que praticaram diversos crimes, que têm indícios de práticas criminosas. Eles são os futuros legisladores. Isso fragiliza o aparato estatal e deixa a sociedade fragilizada em relação à segurança pública. A situação tende a piorar enquanto nós permitirmos isso.

FOLHA - A quem o sr. se refere?

QUEIROZ - Hoje a sociedade já grita. Até mesmo pela Operação Satiagraha, já se criou um movimento popular. É a primeira vez na história do país que várias instituições discutiram uma investigação policial. Há essa necessidade. Já nasceu e está crescendo um movimento nacional de resistência à corrupção. Isso é um fato.

FOLHA - Que tipo de manifestação demonstraria isso?

QUEIROZ - Várias, inclusive mensagens, cartas que tenho recebido. Muitas cartas, até de crianças. São manifestações que deixam a gente muito fortalecido. (...) Hoje eu sou muito mais determinado do que era antes. Se eu já tinha uma determinação imperiosa de não temer, praticamente se multiplicou com esse apoio popular.

FOLHA - Como o sr. define seu comportamento na Satiagraha?

QUEIROZ - Meu comportamento é como o do cidadão que há muitos anos se vê sem solução para situações que ocorrem no país, em especial no combate à corrupção. Esse trabalho foi praticamente um grito que saiu da garganta de todos os brasileiros que se sentiam oprimidos por estarem, aí sim, algemados por poderes que até então não identificamos. A sociedade estava com isso entalado na garganta e fui apenas o instrumento desse povo que se vê oprimido quando tem diante de si vários atos de corrupção, de desvios de recursos públicos.Fui o porta-voz do grande grito contra a corrupção no país.

FOLHA - O sr. se arrependeu de algo que tenha feito?

QUEIROZ - Não, em absoluto.Cumprimos com o nosso dever.

FOLHA - O sr. esperava tanta reação, inclusive negativa, ao trabalho?

QUEIROZ - As críticas vieram de um segmento que tem compromisso com outros valores. São críticas comprometidas com outros ideais, não com o ideal que a sociedade hoje sonha e almeja. Talvez por isso essa repulsa da sociedade e do povo quanto ao ocorrido.

FOLHA - O que levou o sr. ir ao Ministério Público e à Justiça para expor problemas que o sr. enfrentou na investigação?

QUEIROZ - Não posso responder porque está coberto pelo sigilo.

FOLHA - Houve tentativa de obstrução do seu trabalho?

QUEIROZ - Sobre isso não posso falar porque é alvo da investigação que está em andamento.

FOLHA - Como o sr. recebe as críticas sobre supostos excessos em operações policiais, como indícios que não se confirmam ou citações a pessoas que depois são inocentadas?

QUEIROZ - As críticas advêm de uma minoria que demonstra com o que está comprometida.São pessoas que têm outro compromisso. Obviamente, todas as críticas são bem-vindas, até para uma avaliação do caso.

FOLHA - Por que o sr. incluiu um capítulo sobre mídia e jornalistas?

QUEIROZ - Só posso falar em outro contexto, não sobre o inquérito. O papel da mídia é importante. O país vive um momento em que todas as instituições discutem todos os seus problemas. A mídia não poderia ficar à margem desse processo. Teria também que discutir nesse mesmo contexto. Porque há necessidade de se discutir o papel ético, profissional, das informações que são veiculadas. O compromisso com a verdade. Achei muito oportuna essa discussão também em termos de mídia e de imprensa.

Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc0308200802.htm