quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

CONCEITO DE AUTORIDADE POLICIAL

VERDADEIRA AULA DE DIREITO ADMINISTRATIVO É A DECISÃO PROFERIDA NOS AUTOS Nº 253/2002 – CORREG., DA LAVRA DO DR. JÚLIO OSMANY BARBIN, JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÕES CRIMINAIS DA COMARCA DE RIO CLARO – SÃO PAULO, APRECIANDO UMA REPRESENTAÇÃO FORMULADA PELO TENENTE CORONEL PM MIGUEL PINHEIRO EM DESFAVOR DO DELEGADO JOAQUIM ALVES DIAS, SOB ALEGAÇÃO DE QUE A PM CONDUZIRA UM INDIVIDUO À PRESENÇA DO CITADO DELEGADO E ESTE DETERMINOU QUE FOSSE POSTO EM LIBERDADE.

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PODER JUDICIÁRIO

ESTADO DE SÃO PAULO

Vistos, etc…

“A Polícia Militar não é órgão censor da Polícia Civil e a recíproca é verdadeira”. As co-irmãs são instituições destinadas à manutenção da segurança e da ordem pública, cada uma delas com funções específicas designadas na lei, sem possibilidade de conflitos no âmbito de suas atuações, mercê da perfeita e legal divisão de tarefas.
No caso dos autos, que entendo como representação do Comandante do 37º BPMI, Senhor Tenente Coronel PM Miguel Pinheiro, em face de atos de Polícia Judiciária de Delegado de Polícia de Rio Claro, sob autoridade administrativa do Dr. Joaquim Alves Dias, consta que em casos de prisão realizada por militares, quando apresentado o infrator à autoridade policial esta teria colocado o infrator em liberdade sem lavrar o flagrante, pondo a perder o serviço da Policia Militar, em prejuízo da sociedade como um todo.Sem dúvida alguma louvável a preocupação do dinâmico Comandante Tem. Cel. Miguel Pinheiro em proteger a sociedade, de cujo corpo todos nós participamos.Mas, acima de qualquer outro argumento, somos uma sociedade organizada, em que, como já posto em linhas atrás, têm-se funções específicas, atribuídas a cada órgão, instituição social, colocado a consumo da atividade social e como tal assim prestigiado.
A Polícia Militar, de longo conceito histórico e glorioso, incumbe o sagrado dever de impedir que as infrações ocorram, via de realização da Polícia Preventiva ou Ostensiva, fincada essa função na presença do Policial Militar fardado e pulverizado no corpo social que defende. A Polícia Civil está afeta a administração da Polícia Judiciária realizando a Polícia Repressiva, que atua depois da ocorrência do fato delituoso, levando seu autor à estrutura do Poder Judiciário, onde se lhe apurará a culpabilidade em sua dimensão “latu sensu”: responsabilidade e punibilidade, segundo ensinamentos do saudoso e festejado administrativista Helly Lopes Meirelles.
Assim, colocada a questão, fácil inferir, por via de conclusão, que a autoridade policial, por excelência e na forma de nossa estrutura legal, que suporta a organização da Secretaria de Segurança Pública, é o DELEGADO DE POLÍCIA. A ele incumbe, mercê de sua formação jurídica e por exigência de requisitos para o ingresso na carreira policial, apreciar as infrações penais postas por seus agentes (policiais, genericamente entendidos), sob a luz do Direito, máxime, em se cuidando de Segurança Pública, do DIREITO PENAL. Sempre que tiver conhecimento de uma infração penal o Delegado de Polícia (autoridade policial por excelência) deve fazer uma avaliação, a fim de visualizar se se cuida fato típico, como espelha a Teoria da Tipicidade, o “TATBESTAND” do Direito Alemão, ou não, daí procedendo de acordo com o que a lei regrar.
Do mesmo modo, concluído que se cuida de “fato típico”, incumbe ao Delegado de Polícia, por via da formulação de um juízo de valor, decidir se se trata de prisão em flagrante, em quase-flagrante (flagrante próprio e impróprio), flagrante preparado, ou, se, efetivamente, não houve flagrante.A formulação desse juízo de valor não tem regra matemática a ser seguida. Cuida-se de uma avaliação subjetiva, realizada com os supedâneos do conhecimento jurídico e da experiência, amealhada ao longo da carreira policial. É conhecimento personalíssimo e ao abrigo de qualquer influência externa. Corolário do exposto não é falho afirmar-se que entregue o fato à Autoridade Policial, por qualquer agente de sua autoridade, aquela primeira etapa do procedimento administrativo policial está exaurida. E se é cômodo afirmar que “o caso foi levado ao conhecimento da autoridade policial” mais cômodo, ainda deve ser, após, não se fazerem ingerências no âmbito de outras atribuições, como a respeito verberaram todos os Meritíssimos Juizes de Direito e Promotores de Justiça que atuaram neste procedimento (fls. 15 a 22 e 24 a 35), cujos argumentos encampo para subsídios de minhas conclusões.Entendo, com o abono das manifestações expendidas nestes autos, pelos meus colegas, que a presente representação só teria sentido se atribuído fosse fato criminoso à autoridade policial, o que, me parece, efetivamente, não houve, e nem foi propósito tal desta representação ao Juiz de Direito, Corregedor da Polícia Judiciária da Comarca de Rio Claro.Repito, para bem cumprir sua missão é dever do Delegado de Polícia proceder a uma formalização, mesmo que precária de tipicidade, pois a definitiva incumbe ao Ministério Público, do fato criminoso a si colocado, para daquela tipicidade precária tirar efeitos jurídico-processuais, bem assim decidir se é infração da qual o agente se livra solto, mediante fiança, ou sem direito a fiança (inafiançável), ou se se cuida de crime hediondo ou qualquer outro, para pedir a segregação temporária do indiciado se julgar necessário, caso não opte pela flagrância do delito.
Todo esse complexo desenrolar subjetivo está afeto ao Delegado de Polícia, em cuja atividade funcional está a salvo de qualquer interferência, mesmo do Ministério Público, órgão de fiscalização externa da Polícia Civil (C.F./88 e L.O.M.P.), caso não haja, na espécie, a prática de ilícito (advocacia administrativa, favorecimento pessoal, corrupção etc.) de parte da autoridade policial atuante.
Para completar o raciocínio aqui desenvolvido é oportuno colocar que na estrutura da Secretaria de Segurança Pública, as autoridades administrativas hierarquizadas são o Governador do Estado, seu Secretário da Segurança Pública e o Delegado de Polícia Judiciária.
Todos os demais integrantes dessa complexa estrutura são “agentes da autoridade policial” que os doutos chamam de “longa manus”, em substituição ao particípio presente do verbo agir para tal fim substantivado.
Assim, são agentes da autoridade policial judiciária, que é o Delegado de Polícia, toda a Polícia Militar, desde seu Comandante Geral até o mais novo praça e todo o segmento da organização Polícia Civil, bem assim o I.M.L., I.P.T etc…(grifos acrescidos) e nenhuma dessas categorias podendo influenciar os atos da autoridade policial, enquanto “atos de polícia judiciária” sujeitos a avaliação jurídico-subjetiva. Ademais, se o ilícito foi apurado via “persecutio criminis” pela instauração de inquérito policial, iniciado por portaria e não por ato de prisão em flagrante, essa situação não retira, jamais, a nobreza do ato do policial militar que, despojando-se da própria vida cumpre o seu altruístico dever de defender a sociedade, aliás o que a gloriosa Polícia Militar do Estado de São Paulo,tão bem sabe fazer..
Ante o exposto e não havendo “in casu”, ilícito algum de interesse desta Corregedoria, arquivem-se os autos, dando-se ciência desta decisão ao Sr. Tenente Coronel PM Miguel Pinheiro, dinâmico Comandante do 37º B.P.M.I. do Rio Claro e ao Dr. Joaquim Alves Dias, competente Delegado Seccional de Polícia de Rio Claro.
Rio Claro, 14/01/2003
Julio Osmany Barbin
Juiz de Direito

REMOÇÃO ILEGAL

Confiram no blog precedentesjudiciais.blogspot.com (acesse pelo link ao lado) mais uma liminar concedida contra ato de remoção ilegal praticado contra Delegado de Polícia, ocorrida na capital paulista. 

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

ENCONTRO NACIONAL DE CHEFES DE POLÍCIA

No último dia 15 de setembro ocorreu em Goiânia o 2o Encontro Nacional dos Delegados Gerais de vinte Estados da Federação.
Uma das propostas do Encontro foi pedir empenho na aprovação da Lei Geral da Polícia Civil, cujo projeto encontra-se há anos sendo discutido no Congresso Nacional. 
É um absurdo que uma instituição secular como a Polícia Civil e que exerce função constitucional de suma importância e basilar do sistema de Justiça criminal brasileiro ainda não possua uma lei orgânica de âmbito nacional.  

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CHEFES DE POLÍCIA DO BRASIL REALIZAM O 2º ENCONTRO NACIONAL EM GOIÂNIA






Goiânia, 22 de Setembro de 2011



Goiânia, 15 de setembro de 2011.





Reunidos no 2º Encontro Nacional de Chefes de Polícia do Brasil, aos quinze dias do mês de setembro de 2011, no Teatro da Universidade Paulista (UNIP), na cidade de Goiânia, Estado de Goiás, com a presença de 21 Chefes de Polícia, do presidente do Conselho Nacional dos Chefes de Polícia Civil (CONCPC), Dr. Edemundo Dias de Oliveira Filho, da Secretária Nacional de Segurança Pública ─ MJ, Dra. Regina Miki, do Governador em Exercício do Estado de Goiás, Dr. José Eliton Figueiredo Júnior, nós, Chefes da Polícia Judiciária brasileira, vimos a público expor, dada a imprescindibilidade, capilaridade e importância de nossa atuação na sociedade, pontos que hão de corroborar a qualificação de nossos serviços e, ainda, algumas das adversidades que enfrentamos.



Urge redefinirmos o papel da Polícia Judiciária brasileira e concedermos a essa instituição ─ indispensável ao Estado e ao cidadão ─ condições ideais para exercício do dever que a Constituição da República lhe atribui. Para tanto, o Conselho Nacional dos Chefes de Polícia Civil propõe:



1 - Empenho na aprovação da Lei Geral da Polícia Civil, com o comprometimento do Ministério da Justiça, considerando o apoio firmado pela Secretária Nacional de Segurança Pública, Dra. Regina Miki, neste Encontro Nacional do CONCPC;



2 - Padronização de nossas simbologias, para o fortalecimento institucional, tais como: indumentárias; viaturas caracterizadas; carteiras funcionais; banners institucionais, entre outras.



3 - Diagnosticar a Polícia Judiciária brasileira (recursos materiais e humanos);



4 - Viabilizar a integração dos bancos de dados entre as instituições policiais;



5- Constituir e instituir um modelo de planejamento estratégico para as Polícias Judiciárias;



6 - Sistematizar a difusão das boas práticas policiais;



7 - Padronizar a formação qualificação e aperfeiçoamento dos policiais civis;



8 Desenvolver políticas de valorização da carreira policial civil (delegados, agentes e escrivães);



9- Promover seminários/conferências como ambiente de reflexão para o aprimoramento da instituição policial civil;





É certo que, com o nosso comprometimento nas respectivas instituições policiais civis, estaremos contribuindo com o aprimoramento da Polícia Judiciária brasileira, elevando-a ao patamar que a sociedade deseja e merece.







Chefes de Polícia Civil do Brasil presentes no Encontro de Goiânia





1 – EDEMUNDO DIAS DE OLIVEIRA FILHO - GOIÁS - PRESIDENTE DO CONCPC

2 – MANOEL CARNEIRO SOARES CORDEIRO – PERNAMBUCO

3 - NORDMAN RIBEIRO - MARANHÃO

4 - LUCIANA MACHADO MATOS KULAY – DELEGADA ADJUNTA DO DELEGADO GERAL – RORAIMA

5 - JAIRO LELLIS FILHO – MINAS GERAIS

6 - PAULO RUBENS VILELA – MATO GROSSO

7 - AILTON JORGE BARRETO ATAYDE – PARÁ

8 - FÁBIO ROGÉRIO SILVA – RIO GRANDE DO NORTE

9 - JORGE RAZANAUSKAS NETO - MATO GROSSO DO SUL

10 - LUIZ CARLOS DE ARAÚO DANTAS – CEARÁ

11 - REBECCA DE PAULA CARDOSO –ALAGOAS (Representante)

12 - JÉFERSON LISBOA GIMENES –DISTRITO FEDERAL (Representante)

13 - REGINALDO DE MENEZES BRITO – TOCANTINS

14 - TITO GUIMARÃES NETO - AMAPÁ

15 - SEVERIANO PEDRO DO NASCIMENTO FILHO – PARAÍBA

16 - JOEL LYRIO JÚNIOR – ESPÍRITO SANTO

17 - CLAUDINOR SOARES MUNIZ - RONDÔNIA

18 - FERNANDO VELOSO – RIO DE JANEIRO (Representante)

19 - HELIO SORRE OLIVEIRA PAIXÃO – BAHIA

20 - RANOLFO VIEIRA JÚNIO – RIO GRANDE DO SUL







Pronunciamento do Delegado Geral da Polícia Civil de Goiás, Edemundo Dias, no Encontro Nacional dos Chefes de Polícia:





EU TAMBÉM TENHO UM SONHO



Eu também sou vítima de sonhos adiados, de esperanças dilaceradas, mas, apesar disso, eu ainda sonho, porque a gente não pode desistir jamais de sonhar” - Luther King.



O mundo, e especialmente o Brasil, vive, em matéria de segurança pública, novos e complexos encargos, entre os quais um se sobressai: a definição do papel da polícia. Ou seja, como essa instituição universal e secular deve se postar ante os desafios do novo milênio. Esse é o tema central deste Encontro Nacional de Chefes de Polícia Civil, que o Estado de Goiás, se sente honrado em sediar, para discutir a segurança pública brasileira.



Com efeito, talvez a maior característica da contemporaneidade seja justamente a ausência da segurança. Segurança, no sentido mais amplo do termo. Vivemos num mundo onde uma coisa é certa: não há certeza. A chamada “pós-modernidade” impôs a toda sociedade no geral, e, ao Estado em particular, uma crua realidade: a utopia do controle e do bem-estar social simplesmente se desmoronou.



Aliás, todos os eventos naturais, a economia globalizada, a ditadura paranóica do consumismo, o frenesi da globalização, a ânsia da frustração pela inalcançável paz, prazer e felicidade, e o domínio frio e monstruoso da tecnologia empurram o homem mais e mais para uma ansiedade constante, conflituosa e, sobremodo, violenta. As subversões sociais se agigantam do oriente ao ocidente, da sofisticada Europa aos convulsionados países árabes, de crentes, ateus e hereges, aos cristãos, budistas e mulçumanos. Ninguém mais está livre do medo e da insegurança.



No enfrentamento ao crime temos hoje uma questão central: as drogas. O elevadíssimo índice de consumo de drogas torna o narcotráfico um negócio fantástico. As empresas-crime operam a demanda mais requerida pela lei áurea do capitalismo: a lei da oferta e da procura. Não importa quantas vidas sejam ceifadas pela fissura da pedra mortal. A Organização Mundial da Saúde já calcula que todas as famílias brasileiras têm, pelos menos, um membro dependente químico de drogas lícitas ou ilícitas.



É fato incontroverso: o Brasil vive índices epidêmicos de criminalidade. Taxas de homicídios atingem cifras inconcebíveis e inaceitáveis (53 mil por ano). A polícia, como a representação primeira do Estado, cuja função precípua é justamente o controle do monopólio da violência legítima, patina nesse terreno perigoso, sem as condições mínimas e necessárias para a assunção plena das responsabilidades que lhe são conferidas pela Carta Magna, impostas pelo poder público e cobradas cotidianamente pela sociedade, mormente, pela imprensa.



A Polícia Judiciária, sem qualquer demérito às outras instituições que fazem segurança pública no Brasil, por mandamento constitucional é a polícia que tem balcão. Com capilaridade estendida em todos os rincões deste imenso País continental. Porém, é a mais fragilizada.



Urge, portanto, concedermos a essa instituição — indispensável ao Estado e ao cidadão — condições cabais para exercício do dever que a Constituição da República lhe atribui.



Para tanto, o Conselho Nacional dos Chefes de Polícia Civil propõe:

1- MODERNIZAÇÃO DA GESTÃO - Entramos no século XXI com a mesma gestão organizacional dos séculos passados. A sociedade hodierna merece e exige uma Polícia Judiciária tão eficiente como os novos tempos se apresentam, além de uma prestação de serviço que atenda à dignidade e à cidadania postuladas constitucionalmente.



2- AUTONOMIA FEDERATIVA DAS POLÍCIAS – Estatuída na Constituição Federal, as Polícias são organizadas ao alvedrio das diversas políticas estaduais ou distrital, com os contornos de uma polícia subserviente que atende apenas aos interesses de governos e não aos interesses de Estado; em um país continental, onde os crimes sem divisas geográficas assolam cada vez mais a sociedade. Assim, para o fortalecimento e aprimoramento institucional da Polícia Judiciária brasileira, esta reunião dos Chefes de Polícia Civil, sob a égide de uma visão crítica e dialética, vem oportunizar a suplantação de excrescências que o próprio sistema federativo acaba indiretamente nos impingindo.



3- COMPROMETIMENTO ENTRE TODOS - A proatividade e a quebra de paradigmas estão nas mãos dos Conselheiros deste CONCPC, juntamente com o Governo Federal (SENASP/MJ), com o desiderato de proporcionar a modernização da Polícia Judiciária, através de tratativas e acordos (pactos) que cada ator pode assumir e implementar em seus respectivos entes federativos para que, ao final, toda a Policial Civil se fortaleça e alcance a excelência que desejamos. Assim serão temas propostos como desafios:



1. EMPENHO NA APROVAÇÃO DA LEI GERAL DA POLÍCIA CIVIL;

2. PADRONIZAÇÃO DAS SIMBOLOGIAS, PARA O FORTALECIMENTO INSTITUCIONAL, TAIS COMO:

a- Indumentárias;

b- Viaturas caracterizadas;

c- Carteiras funcionais;

d- Banners propagandísticos;

e- Etc.

3. DIAGNÓSTICO DA POLÍCIA JUDICIÁRIA BRASILEIRA;

4. INTEGRAÇÃO DE ACESSO A BANCO DE DADOS ENTRE AS INSTITUIÇÕES POLICIAIS;

5. PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO BÁSICO PARA AS POLÍCIAS JUDICIÁRIAS;

6. SISTEMATIZAÇÃO DA DIFUSÃO DAS BOAS PRÁTICAS POLICIAIS;

7. PADRONIZAÇÃO DA FORMAÇÃO, QUALIFICAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO DOS POLICIAIS CIVIS;

8. DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICAS DE VALORIZAÇÃO DO POLICIAL CIVIL (delegados, agentes e escrivães);

9. PROMOÇÃO DE SEMINÁRIOS/CONFERÊNCIAS COMO AMBIENTE DE REFLEXÃO PARA O APRIMORAMENTO DA INSTITUIÇÃO;

10. INTEGRAÇÃO DAS FORÇAS DE SEGURANÇA E DEFESA SOCIAL COMO OTIMIZAÇÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA BRASILEIRA; ETC.



4- ARTICULAÇÃO DA SENASP - como órgão indutor de políticas nacionais de segurança pública do Governo Federal, a SENASP, tem envidado esforços, através da Secretária Nacional de SP, Dra. Regina Miki, no sentido de proporcionar não só o aparelhamento material das Polícias Civis, mas também proporcionar uma ambiência de mudanças de paradigmas, para que todas as forças policiais possam se identificar como uma só e, assim, modernizarem-se para estar condizente à “Polícia Civil do Séc. XXI”.



Que Deus, na sua infinita bondade e misericórdia, abençoe os participantes desse magnânimo evento e que possamos ter um fórum produtivo. A cidade de Goiânia e o Estado de Goiás estão sendo privilegiados com a presença de todos.



Obrigado,

Edemundo Dias de Oliveira Filho.



Goiânia, 15 de setembro de 2011.





Disponível em: http://www.policiacivil.go.gov.br/noticias/publicacao.php?publicacao=65424

domingo, 17 de julho de 2011

A CARREIRA DO DELEGADO DE POLÍCIA É JURÍDICA

Publicamos abaixo brilhante artigo de autoria da Dra. Tani Bottini, que muito bem esplana as razões e fundamentos legais que demonstram que a carreira de delegado de polícia é jurídica.

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É inquestionável que os Delegados de Polícia são integrantes das carreiras jurídicas


Autor: Tani Bottini

Muito se tem falado e escrito sobre ser ou não o Delegado de Polícia integrante das carreiras jurídicas públicas. Além das argumentações apresentadas por diversos defensores, partimos primeiro do fato que a Constituição Federal de 1988 traz no artigo 144, no seu § 4º que as polícias civis serão dirigidas por Delegados de Polícia de carreira, exercendo estes as funções de polícia judiciária.

A formação necessária para ser um Delegado de Polícia é a de ser bacharel em direito e ser aprovado por meio de concursos públicos de provas e títulos. Aqui já notamos a diferença com outras tantas carreiras da Administração Pública, pois assim como a Magistratura, o Ministério Público e a Defensoria Pública, para o cargo de Delegado de Polícia os títulos exigidos no concurso estão ligados a um desenvolvimento do candidato na área do Direito; seja pela conclusão de doutorado, mestrado, especialização, artigos jurídicos publicados, da mesma maneira que as outras carreiras jurídicas citadas. Lembrando que a definição dos títulos a serem apreciados no concurso público está intimamente ligada ao grau de responsabilidade e à complexidade do cargo a ser exercido. Continuando os paralelos, obrigatoriamente há a participação da Ordem dos Advogados do Brasil nas bancas de concurso para Delegado de Polícia, ainda que não seja exigida aprovação anterior no exame da Ordem.

Toda esta preocupação em relação à capacitação jurídica do candidato se dá porque os Delegados de Polícia tem a obrigatoriedade de analisar fatos e aplicar a lei, e ainda lhes é dada à possibilidade de representar por medidas cautelares, medidas estas que poderão vir a restringir direitos e a liberdade dos cidadãos. Até porque, diferentemente dos membros do Ministério Público que requerem, o Delegado de Polícia representa, ou seja, como Autoridade Policial faz a exposição de motivos demonstrando a necessidade da realização de uma providência legalmente prevista, sustentando, assim um pedido jurídico a uma outra Autoridade, esta Judiciária. E mais, somente o Delegado de Polícia tem a atribuição de restringir a liberdade de alguém, independente de ordem do juiz, ainda que posteriormente haja uma análise judicial.

Afinal, o Delegado de Polícia é um dos profissionais diretamente ligados à distribuição da Justiça na sociedade. É ele quem primeiro fará um juízo de valor da conduta, adequando ou não o fato à conduta prevista, ou seja, classificando-a ou não como crime ou fato penalmente irrelevante. Seu discernimento é peça fundamental na concretização da pacificação social, como muito bem colocou o Dr. Archimedes Marques em artigo recente, “Delegado de polícia é da carreira jurídica?”, é ele quem irá decidir se há ou não justa causa para iniciar uma persecução penal contra determinada pessoa. Óbvio que esta análise dos fatos brutos deverá se feita por quem tenha excelente capacitação jurídica, que esteja ciente de todas as conseqüências a que o acusado ficará exposto, pois somente assim se poderá proteger os direitos dos cidadãos de não se verem processados injustamente.

Podemos ainda lembrar que o cargo nasceu da Magistratura. Em 1841 surgiu a figura do Delegado de Polícia, e cabia ao Imperador nomear, dentre os Juízes de Direito, o chefe de polícia. Ainda que atualmente a carreira de Delegado de Polícia, pertencente ao Poder Executivo, tenha se distanciado da Magistratura, com esta mantém íntima ligação, pois é ao Juiz de Direito que se destina o Inquérito Policial. Logo, fica claro que os Delegados de Polícia possuem a mesma formação jurídica do Juiz, do Membro do Ministério Público ou do Defensor Público, todas reconhecidamente carreiras jurídicas públicas.

À parte das atribuições tipicamente jurídicas, existe ainda a obrigatoriedade de um desenvolvimento profissional do Delegado de Polícia em relação à gestão em segurança pública, sem que com isso seja minimizado o perfil jurídico do cargo. Esta gestão é algo que acrescenta na capacitação do profissional e não que exclui os Delegados de Polícia do rol das carreiras jurídicas públicas.

É óbvio que quando falamos de gestão em segurança pública, não estamos ligando os Delegados de Polícia àquela visão simplista de alguns, que querem colocar estes no mesmo patamar dos oficiais da Polícia Militar, pois a estes cabe a difícil tarefa de manter a ordem pública e atuar como “longa manus” da Autoridade Policial (expressão que designa o executor de ordens). Autoridade Policial esta que é, indubitavelmente, o Delegado de Polícia. Assim, não se pode ser igual, se são diferentes, como já dizia Aristóteles quando falava do Princípio da Contradição: “Nada pode ser e não ser simultaneamente”. Se a Polícia Militar é agente da Autoridade Policial, eles não podem ser ao mesmo tempo a própria Autoridade Policial; encerrando aqui qualquer discussão em relação às forças militares de Segurança Pública.

Seguindo nosso raciocínio, ainda que não haja o reconhecimento formal de alguns governos estaduais e de outras carreiras sobre estar ou não o Delegado de Polícia inserido entre as carreiras jurídicas, o Poder Legislativo tem demonstrado sua crença e confiança e vem ampliando as atribuições do cargo. Claro que isso se deve ao bom desempenho que os Delegados de Polícia tem tido no desenvolver de seu mister. Podemos perceber que o Código de Processo Penal, com suas recentes reformas, brinda a classe com maiores responsabilidades.

A Lei Federal nº 12.403/2011, que altera artigos do Código de Processo Penal, trouxe clareza nesse posicionamento do Poder Legislativo, quando transferiu aos Delegados de Polícia a obrigação de aplicar a fiança a uma maior gama de condutas delitivas, inclusive daquelas punidas com pena de reclusão, que é o regime mais gravoso de cumprimento de pena previsto no nosso ordenamento jurídico. Indubitavelmente, estamos diante da entrega de maiores responsabilidades nas mãos dos Delegados de Polícia. Logo, só podemos pensar que os nossos legisladores entendem a importância desses profissionais, inclusive com atribuições até mais garantistas do que diversas outras já reconhecidamente integrantes das carreiras jurídicas. Como já havia salientado no meu artigo anterior “Porque as reformas do Código de Processo Penal após a Constituição Federal de 1988 confirmam a manutenção do Inquérito Policial presidido por um Delegado de Polícia”, o Delegado de Polícia é figura essencial para a defesa das garantias dos cidadãos frente ao Estado, como já demonstrado pela nossa Carta Magna de 1988.

Além das pressões e incompreensões a que o reconhecimento do cargo como carreira jurídica está sujeito, por vezes o Delegado de Polícia ainda tem que enfrentar o despreparo e a falta de consciência de alguns integrantes da carreira, até mesmo em cargos de elevada envergadura, os quais acreditam que não podem ou não devem fazer parte desta classificação, pois para eles ao Delegado de Polícia cabe apenas ser mero elaborador de boletins de ocorrências e de autos de prisão em flagrante, sem qualquer apreciação jurídica dos fatos. Infeliz daquele que se mantém atrelado a esta visão tacanha de si mesmo e de sua capacidade e saber jurídico.

Diante destas ilações, somente nos cabe insistir no reconhecimento governamental da condição de carreira jurídica pública ao Delegado de Polícia, inclusive com direito a receber um salário digno às atribuições que exerce, como alguns Governos Estaduais vêm fazendo, demonstrando uma capacidade administrativa privilegiada de saber antever novas expectativas sociais.



Tani Bottini e Delegada de Polícia do Estado de São Paulo, pós-graduada em Direito Penal pela Escola Paulista da Magistratura, professora de Direito Administrativo em curso preparatório para concurso. Email:tbottini@ig.com.br

REFERÊNCIAS

BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007.

ZANELLA DI PIETRO, Maria Sylvia. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2ª edição, 1991.

BOTTINI, Tani. Por que as reformas do Código de Processo Penal após a CF de 1988 confirmam a manutenção do inquérito policial presidido por um delegado de polícia. Disponível em:http://jus.uol.com.br/revista/texto/12639. Acesso em: 28 jun. 2011.

MARQUES, Archimedes. Delegado de polícia é da carreira jurídica? Disponível em:http://www.conjur.com.br/2009-jun-05/delegado-policia-considerado-carreira-juridica Acesso em: 20/07/2011.

CINTRA, Luciano Henrique. Delegado de polícia deve ser enquadrado na carreira jurídica. Disponível em :http://www.conjur.com.br/2008-jul-22/delegado_enquadrado_carreira_juridica Acesso em: 20/07/2011

FREITAS, Vladimir Passos de. A Polícia Militar na ordem jurídica brasileira Disponível em:http://www.conjur.com.br/2011-jun-19/segunda-leitura-policia-militar-ordem-juridica-brasileira Acesso em: 20/07/2011

JORGE, Higor Vinicius Nogueira. Delegado de Polícia e carreira jurídica. Disponível em :http://www.webartigos.com/articles/17708/1/DELEGADO-DE-POLICIA-E-CARREIRA-JURIDICA/pagina1.htmlAcesso em: 20/07/2011

Disponível em: http://www.adpesp.org.br/artigos_exibe.php?id=181

segunda-feira, 4 de julho de 2011

DOSIMETRIA EXTRAPROCESSUAL E AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE DELITO

1 Noções Introdutórias:


Com o movimento de especialização da violência promovida a partir da década de 90, considerável parte dos delitos migram do Código Penal para a Legislação esparsa e, com isso, a tentativa de inauguração de microssistemas normativos, a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente, Código de Defesa do Consumidor, Lei dos Crimes Ambientais, Código de Transito Brasileiro, dentre outros.


Nessa toada, a Lei 9.099/95 de inegável contribuição para a efetividade da prestação jurisdicional, com institutos de vanguarda como a transação penal, a composição civil dos danos, suspensão condicional da pena, além de regras pertinentes a ação penal, ao mesmo tempo em que lançam luz ao fim do acúmulo de processos do Judiciário Brasileiro, incluem delitos que, malgrado de preceito secundário objetivamente adequado aos Juizados, são de extraordinária repercussão social, porquanto motivos de política criminal recomendem a preservação do bem jurídico tutelado.


E, corrigindo distorção pontual, exsurgem os crimes hoje sob as regras do Estatuto do Idoso e de Leis que disciplinam a violência de gênero, como a Lei Maria da Penha, no que poderíamos denominar de fase de adequação a injustiças verificadas.


Com efeito, se primeiro se especializa e depois se corrige, em curto espaço de tempo, vislumbramos evidente violação ao princípio da segurança jurídica, função que não se desincumbe o legislador por pressão momentânea, sanáveis, contudo, com a exasperação da pena no caso concreto, sempre que a preservação do bem jurídico admitir. Portanto, é cabível a aplicação da dosimetria no auto de prisão em flagrante delito ou isso deve ser analisado tão-somente na sentença condenatória?

2 Dosimetria endoprocessual e extraprocessual:

Definimos dosimetria endoprocessual como aquelas decisões do juiz que utilizam do cálculo da pena, tanto na sentença condenatória, quanto em quaisquer momentos processuais em que a dosimetria é valorada e analisada, a exemplo do acertamento de competência.


Nesse passo, para evitar aparência de impunidade, principalmente na primeira fase da persecução criminal, vale a colação regras de aplicação de pena, ou seja, regras que a autoridade policial tem o dever-poder de fazer atuar, como a aplicação das causas de aumento de pena no auto de prisão em flagrante delito (extraprocessual).


Nos atos processuais ou policiais, enquanto analisada a pena em abstrato, como na decisão do delegado de polícia em autuar alguém em flagrante, seja para efeitos de transação e suspensão condicional do processo afetas ao Ministério Público e, nos atos judiciais ainda que não relativos à pena em concreto, aplicar-se-ão as causas de aumento e diminuição de pena ou a exasperação do concurso de crimes.


Nesse sentido, a Súmula 243 do STJ: O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.

3 Causas de aumento e diminuição da pena:

Conhecidas como majorantes e minorantes, são aplicadas na terceira fase do sistema trifásico desenvolvido por Nelson Hungria e, estabelecidas em quantidades fixas ou variáveis.


Valoradas sobre o resultado da pena resultante da segunda fase da dosimetria, pode decorrer resultado acima ou aquém do preceito secundário.


Observe-se, contudo, que para definição de competência e efeitos no auto de prisão, não incidem sobre a pena base (art.59 do Código Penal), atenuada ou agravada, mas exatamente sobre a pena in abstrato, em seu grau máximo, aumentada no máximo ou diminuída do mínimo, cujo resultado será objeto de cotejo com a Lei 9.099/95.


Decerto, por indução, delitos como o pernicioso “tráfico de animais” podem fazer defluir resposta estatal adequada, ao passo que retira do Legislador a necessidade de especialização desmesurada da violência, evitando-se, desse casuísmo, menção expressa de proibição de institutos da Lei dos Juizados, como previsto na Lei Maria da Penha ou a fixação desarrazoada de penas que venham a ferir o princípio da proporcionalidade.


Se por um lado o Direito Penal é a ultima ratio, em nome do princípio da ofensividade, como bem defende o professor Luiz Flávio Gomes (nota) na interpretação do delito como ofensa ao bem jurídico, por outro, o Direito Penal Objetivo há que ser interpretado com a máxima efetividade, ainda que nos delitos de menor potencial ofensivo.


Frases como “tudo se resolve em cesta básica” de notória finalidade desmoralizadora das instituições e do próprio bem jurídico, são afastadas sempre que aplicadas as regras extraídas da dosimetria, na adequada individualização e respeito ao princípio da proporcionalidade da pena, de viés garantista.


Para casos que destoam ao bom senso, com insuficiência da intervenção estatal, a despeito da gravidade, como no transporte de centenas de aves sem autorização, cuja regra geral seria a lavratura de um Termo Circunstanciado – existindo causas de aumento de pena –, perfeitamente possível o afastamento de parte dos institutos da Lei 9.099/95. In casu, considerando o concurso material entre os delitos do art. 29 (detenção, de seis meses a um ano) e art. 32, §2º (detenção, de três meses a um ano), da Lei 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais), majorada pela causa de aumento de pena em seu grau máximo (1/3), chega-se a pena em abstrato de 2 anos e 4 meses de detenção, o que afasta a aplicação da Lei 9.099/95 na fase policial da persecução.


Exemplo cotidiano, ainda, verifica-se com o crime previsto no Código de Trânsito Brasileiro. Vale dizer, no crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, mesmo sem considerar as hipóteses do art. 291, §1º, incisos I a III que expressamente já afastam a aplicação da Lei 9.099/95, incidindo as causas de aumento de pena referidas no parágrafo único do art. 303 do CTB, no seu grau máximo (metade), a pena máxima em abstrato será de 3 anos de detenção, hipótese em que não há falar no procedimento do termo circunstanciado, mas sim, em auto de prisão em flagrante delito, malgrado mantenha a representação como condição de procedibilidade. Lapidar nesse sentido o entendimento expendido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso:






EMENTA


APELAÇÃO CRIMINAL - RECEBIMENTO COMO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL - DELITO DE TRÂNSITO - LESÃO CORPORAL CULPOSA E OMISSÃO DE SOCORRO - AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO - SENTENÇA QUE DECRETOU A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE POR TER RECONHECIDO A DECADÊNCIA DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO - INCONFORMISMO DA VÍTIMA – DECRETAÇÃO INDEVIDA - REPRESENTAÇÃO APRESENTADA NO MOMENTO OPORTUNO - INTELIGÊNCIA DO ART. 291 E SEU PARÁGRAFO ÚNICO DO CTB - RECURSO PROVIDO.


Embora o crime de lesão corporal culposa com causa de aumento de pena em razão da omissão de socorro (art. 303, parágrafo único c/c art. 302, parágrafo único - pena máxima de 3 anos de detenção) não seja considerado como de menor potencial ofensivo e por isso, não sujeito ao processamento no Juizado Especial Criminal, há previsão legal para composição civil e eventual renúncia do direito de representação consoante dispõe o art. 291 do CTB, o que se torna necessário reconhecer que a apresentação da representação criminal logo após a realização dessa audiência preliminar de composição é suficiente para afastar a decadência.


SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL


RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL Nº 111939/2007 begin_of_the_skype_highlighting 111939/2007 end_of_the_skype_highlighting - CLASSE I - 13 - COMARCA DE RONDONÓPOLIS


Data de Julgamento: 07-5-2008


EMENTA


RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - SUPOSTO CRIME CONTRA A HONRA - CALÚNIA E INJÚRIA - CONCURSO MATERIAL – OFENDIDA NA CONDIÇÃO DE FUNCIONÁRIA PÚBLICA - AUMENTO DA PENA - EXCLUSÃO PREMATURA DE DETERMINADO ILÍCITO – SOMATÓRIA DAS PENAS ULTRAPASSAM OS LIMITES DOS CRIMES CONSIDERADOS DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM PARA O PROCESSAMENTO DO FEITO - RECURSO PROVIDO.


Compete ao Juizado Comum, e não ao Juizado Especial, processar e julgar crimes que, isoladamente considerados, classificam-se como infrações penais de menor potencial ofensivo, mas que, ligados pelos laços do concurso material, formal ou pela continuidade delitiva, como no caso, pela soma ou exasperação das penas cominadas, seus limites ultrapassam 02 (dois) anos, desfigurando aquela categoria jurídica.


TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 78599/2006 - COMARCA DE VÁRZEA GRANDE


Data de Julgamento: 04-12-2006


Em outra toada, regras de diminuição de pena, com aplicação do mínimo previsto (vg.no crime tentado), poderão determinar à competência do Jecrim, em crimes cuja pena máxima in abstrato ultrapassam inicialmente os dois anos.


4 Analogia à fiança:

Vale mencionar aplicação por interpretação analógica, do entendimento quanto à aplicação da fiança pelo juiz no concurso de crimes. Nesse contexto, HC 105171/ SE (publicado em 08/09/2008) e Súmula 81 do STJ: Não se concede fiança quando, em concurso material, a soma das penas mínimas cominadas for superior a dois anos de reclusão.

5 Circunstâncias legais e aplicação das regras da Prescrição. Não incidência:

As causas atenuantes e agravantes, verificadas na segunda fase do sistema trifásico e, disciplinadas pela parte geral do Código Penal, cuja característica principal é incidir sobre a pena-base, sem patamar definido, pena de violar o princípio da individualização da pena, não se aplicam ao cálculo da pena com repercussão na Lei dos Juizados.


Cabe tão-somente ao juiz, no exercício do prudente arbítrio, à fixação desse quantum.


Ademais, o presente estudo se dissocia da disciplina da prescrição, que não admite a valoração da exasperação da pena do crime continuado no cálculo da prescrição, conforme enunciado sumular 497 do STF: Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença. Não se computando o acréscimo decorrente da continuação.


Ainda, Súmula 220 do STJ: A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva.


Por expressa previsão legal, o cálculo na prescrição não leva em conta a soma resultante do concurso de crimes consoante a dicção do art. 119 do Código Penal.


6 Síntese Conclusiva:

Nessa dinâmica, as importantes consequências advindas da aplicação de regras de dosimetria em momento extraprocessual impõem, em nome da segurança jurídica e preservação dos direitos fundamentais, a adequada e necessária fundamentação na sentença penal condenatória, no auto de prisão em flagrante delito e, para efeito da transação e da suspensão condicional do processo (nota MPSP).


A individualização da pena, conquista do Iluminismo, tem assento constitucional (art.5º, XLVI, da CRFB/88) e constitui uma das chamadas garantias criminais repressivas conforme Cezar Roberto Bitencourt, preconizando a absoluta e completa fundamentação.


Posto isso, mister a aplicação de institutos da dosimetria da pena –individualização da pena em momento extraprocessual, vale dizer, fora da sentença penal condenatória –, como importante fator de difusão e respeito a ordem jurídica nos delitos de menor potencial ofensivo, cujos bens jurídicos tutelados suplantam empiricamente a valoração da pena máxima cominada – ratio da majorante ou minorante –, alinhando-se a aplicação da pena como premissa e objetivo do direito penal moderno.


7 Referências bibliográficas:

GOMES, Luiz Flávio. Princípio da ofensividade no Direito Penal. São Paulo, RT, 2002. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. São Paulo, Saraiva, 2009. v. 1, p. 636.


Nesse sentido a tese 107 da reunião ordinária do Setor de Recursos Extraordinários e Especiais do Ministério Público do Estado de São Paulo, de 08/05/2003: “Para efeito da transação e da suspensão condicional do processo, previstas na Lei n.9.099/95, levam-se em conta as causas de aumento e de diminuição de pena”.


Cancelado o Enunciado 11 do FONAJE: “Não devem ser levados em consideração os acréscimos do concurso formal e do crime continuado para efeito de aplicação da Lei n. 9.099/95”.


Autor: Everson Aparecido Contelli, delegado de polícia titular da Delegacia de Polícia de Piquerobi/SP.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

O QUE É AUTORIDADE POLICIAL?

Publicamos abaixo a brilhantíssima lição do Professor Dr. Hélio Tornaghi, que nos foi enviada pelo nobre colega Dr. Fernando Beato.
Trata-se de assunto bastante oportuno para os tempos atuais, em que membros de várias instituições, inclusive do próprio Poder Judiciário, tem generalizado o conceito de autoridade policial, causando confusão nos meios acadêmicos e na população em geral.

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Parecer do Professor Doutor HÉLIO TORNAGHI

“A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas jurisdições e terá por fim a apuração das infrações penais e de sua autoria”.

Autoridade.
O conceito de autoridade está diretamente ligado ao de poder de Estado. Os juristas alemães, que mais profundamente do que quaisquer outros estudaram o assunto, consideram autoridade (Behörde) todo aquele que, com fundamento em lei (auf gesetzlicher Grundlage), é parte integrante da estrutura do Estado (in das Gefüge der Verfassung des Staates als Bestandteil eingegliederte) e órgão do poder público (Organ der Staatsgewalt), instituído especialmente para alcançar os fins do Estado (zur Herbeiführung der Zwecke des Staates), agindo por iniciativa própria, mercê de ordens e normas expedidas segundo sua discrição (nachPflichtgemässen Ermessen).
Daí se vê que a Autoridade:
a) é órgão do estado; b) exerce o poder público; c) age motu próprio; d) guia-se por sua prudência, dentro dos limites da Lei; e) pode ordenar e traçar normas; f) em sua atividade não visa apenas aos meios, mas fins do Estado.
São ainda os publicistas alemães que proclamam: a autoridade é o titular e portador (Behörde ist der Träger) dos direitos e deveres do Estado (staatlicher Reche und Pflichten). Não tem personalidade (Sie besitzt Keine Rechtspersönlichkeit) mas faz parte da pessoa jurídica Estado.
Em outras palavras: o Estado é o titular do poder público. Mas como o exerce? Evidentemente por meio de pessoas físicas que a lei investe daquele poder.
Elas são o Estado. O pensamento delas é o dele: a vontade delas é a dele. Tudo é deixado à sua discrição. Não ao seu arbítrio, Que arbítrio é capricho e não conhece lei.
Seria ilógico que o Estado traçasse os limites do conveniente ao bem público e a ele próprio, por meio de seus órgãos, violasse esses lindes. Mas dentro da área de legalidade delimitada pelo Estado, cabem aos órgãos encarregados de lhe atingir os fins, a escolha dos meios mais adequados. Têm eles autoridade para escolher os caminhos.
Por outro lado, não se trata do exercício de um poder particular, mas do próprio poder público. Daí a posição proeminente da autoridade em relação aos particulares. O status subjectionis desses em relação ao Estado coloca-os como súditos dos que exercem o poder público. A autoridade, dentro de sua esfera de atribuições, não pede, manda. A desobediência á ordem as autoridade pode até configurar infração penal.

Autoridade policial.
Estabelecido o conceito de autoridade, vejamos o que se deve entender por autoridade policial.
É de todos os tempos a preocupação das sociedades organizadas em zelar o bem comum.
Deve o Estado velar por sua própria segurança e pela de cada um de seus súditos, proteger suas pessoas e resguardar as coisas contra investidas que possam lesioná-las, além de prover aos legítimos anseios de paz e de prosperidade.Esse cuidado especial que incumbe à Polis (palavra com que os gregos exprimiam o que hoje chamamos Estado) dá lugar a uma atividade conhecida como de polícia.Os órgãos que a exercem foram em toda a Antigüidade, considerados altas magistraturas.
O edil, o censor, o cônsul eram, sobretudo, os policiadores da cidade. A polícia era – e é – um dos mais altos órgãos do poder público e por meio de uma atividade importantíssima ela assegura intransigentemente a ordem sem violar mas, ao contrário, protegendo os direitos individuais. A difícil tarefa de estabelecer o equilíbrio entre as exigências da segurança social e as legítimas aspirações individuais é a que ela tem de cumprir a cada instante, sem desfalecimento mas também sem prepotência. Não é fácil encontrar a fórmula conciliatória; esse, porém, é o desafio permanente aos que exercem a autoridade policial.
É ela uma faceta do poder do estado e, exatamente, do poder de intervier a cada momento por meio de atos coercitivos, ou seja, de ordens, normas ou providência que restringem o gozo dos direitos individuais. Esse poder não é somente legítimo; é essencial à natureza do Estado, inclusive do Estado de direito, que encontra sua atividade limitada por lei, mas não está impedido de cumprir sua missão. O exercício dele pode ser contrastado, em cada caso, pelos recursos hierárquicos ou pelo acesso ao Judiciário, mas não poderia ser obstruído sem que se negasse o próprio Estado.
A necessidade de agir com rapidez e a infinita variedade de situações que o legislador não pode prever e, muito menos, disciplinar mercê de normas gerais e abstratas, fazem com que esse poder tenha de ser exercitado discricionariamente, ou seja, segundo a prudência daqueles que o detêm e dentro dos marcos legais.
Esse poder de polícia é próprio da administração em geral, mas particularmente necessário ás autoridades policiais, que exercem de duas maneiras:
- pela prevenção;
- pela repressão.
A prevenção se faz mercê de provimentos, ordens e providências tendentes a proteger as coisas (polícia administrativa) e as pessoas (polícia de segurança). É evidente que a defesa das coisas reverte em favor das pessoas e a destas tem como corolário a daquelas. Assim, para ilustrar a afirmação, uma polícia florestal, embora destinada a proteger bosque, parques, matas e jardins, também acautela quem neles se acha. E, por outro lado, o socorro dado pela polícia de segurança a uma pessoa redunda em tutela para as coisas que tem consigo. Mas a finalidade precípua das polícias administrativas como, por exemplo, a polícia do cais do porto, a polícia de um edifício público, a de um barco do Estado, é cuidar do cais, do edifício, do banco. E o objetivo da polícia de segurança, que é a polícia por antonomásia, polícia por excelência, polícia em sentido estrito, é a proteção de pessoas.
A repressão está entregue, no Estado moderno, ao Poder Judiciário. Mas a polícia colabora nessa tarefa e pratica atos tendentes a promovê-la (polícia judiciária). Entre eles os mais importantes são os que, em conjunto, constituem o inquérito policial. Destina-se esse à apuração das infrações penais e de sua autoria.
E por ser a repressão ato de poder do Estado, somente aos que detêm esse poder é dado exercer funções de polícia judiciária.
E por ser a repressão ato de poder do Estado somente aos que detêm esse Estado e os que servem de instrumento para os primeiros.
Nem todo policial é autoridade, mas somente os que, investidos do poder público, têm por tarefa perseguir os fins do Estado. Não é, por exemplo autoridade policial um perito, ainda quando funcionários de polícia, ou um oficial da Força Pública, uma vez que as corporações a que pertencem são órgãos-meios postos à disposição da autoridade. Missão digníssima que, longe de amesquinhar, exalta os que a cumprem com finalidade e sem abuso, com zelo e sem usurpação do poder. Podem esses servidores, eventualmente atuar como agentes da autoridade, mas não são eles próprios autoridades. Para ficar dentro do exemplo citado: um perito é um instrumento ao serviço da polícia judiciária (contingentemente, da polícia de segurança); a Força Pública é uma arma posta a serviço da polícia de segurança (esporadicamente, da polícia judiciária).
Costumeiramente sou avesso a citar autores quando o que se pede é o meu parecer. Mas não posso deixar de recordar aqui a distinção feita pelo mestre do Direito Público em França, Maurice Hauriou, entre a força pública e o poder público.
Embora velha, a lição merece ser recordada. Em resumo: a força é uma energia física, meio de execução que se desgasta com o uso. O poder é a capacidade de dispor da força e se exercitar sem perda de substância. É a força em repouso, que poderia agir como força e não age. O homem forte não precisa usar os punhos para se impor; ele o consegue mercê do poder de que dispõe.
Ele ordena, determina, decide. Hércules, em repouso, comanda.
Essa distinção está ilustrada nos Estados modernos pela separação constitucional entre força pública e poder de decisão. A força pública, civil ou militar está cuidadosamente separada do poder de decidir; ela é instrumento de execução (Précis de Droit Administratif, 9.ª Ed., Paris, 1919, págs 24 e 25).
O órgão que exerce o poder público pode enfeixar também a força. Mas um órgão criado para ser apenas força não pode licitamente assenhorear-se do poder público.
Em geral a força está entregue a um e o poder a outro. É o caso típico da polícia de segurança: a polícia civil detém o poder, a autoridade, enquanto a polícia militar (Força Pública) detém a força.

Mas, para definir cumpridamente a autoridade policial de que fala o art. 4º, cumpre dar um passo adiante e lembrar que se trata de autoridade de polícia judiciária. Qualquer outro órgão, ainda que exerça autoridade em distinto terreno é estranho ao art. 4º do Código de processo Penal. Em meu anteprojeto, toda essa matéria está subordinada à epígrafe: Da Polícia Judiciária (Liv. II, tít. I, arts. 6º a 21). O código vigente, menos preciso, declara que “a polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais…” (sem grifo no original).
Mas o próprio emprego da palavra autoridade exclui qualquer dúvida, pois seria rematado absurdo que um particular ou um órgão-meio do Estado se arvorasse em autoridade. E a referência à polícia judiciária elimina a intromissão de qualquer autoridade, agente da autoridade ou mero funcionário pertencente a outros ramos da administração pública, ainda que policiais, seria abusivo que um mata-mosquitos, por pertencer à polícia sanitária, resolvesse abrir inquéritos, arbitrar fianças, fazer apreensões etc. Ou que um oficial da Força Pública resolvesse tomar a iniciativa de investigar crimes.
Aliás o sentido da lei surge cristalino quando se leva em conta o elemento histórico.
Autoridades policiais sempre foram entre nós os chefes de polícia, seus delegados e, por vezes, os comissários. Quem pensaria, por exemplo, em transformar um oficial da Força Pública, em autoridade policial? Fugiria, por inteiro, ao papel das polícias militares.
Por outro lado, o art. 4º não comporta outra interpretação literal. Ao dizer que “a polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais”, é evidente que ele se refere aos órgãos da polícia judiciária. Seria tautológico repetir: a polícia judiciária será exercida pelas autoridades da polícia judiciária.
Mas é curial que só a essas ele refere. Ao falar em autoridades policiais esse dispositivo subentendeu: autoridades de polícia judiciária. Teve, portanto, em mira:
1.º) as autoridades. Quem não é autoridade, quem não age motu próprio, quem é órgão instrumental, não está incluído;
2.º) de polícia judiciária e não qualquer outras. Tanto isso é verdade que no parágrafo está dito que a lei poderá abrir exceções, isto é dar competência a autoridades administrativas para fazer inquéritos policiais.
Portanto, só mercê de lei especial pode instaurar inquérito para apuração de infrações penais e de sua autoria, quem é autoridade mas não de polícia judiciária.
As premissas assentadas permitem concluir que são autoridades policiais de que fala a lei de processo, os que:
1.º) exercem o poder de público para consecução dos fins do Estado;
2.º) em matéria de polícia judiciária.
Não são autoridades policiais, no sentido do art.4º:
1.º) os que não perseguem os fins do Estado, mas são apenas órgãos-meios, como por exemplo, os médicos do serviço público, os procuradores de autarquias, os oficiais de Polícia Militar (ou força Pública);
2.º) os que mesmo pertencendo à Polícia em seu sentido amplo, não são polícia judiciária, mas polícia administrativa (ex., Polícia de Parques, corpos de bombeiro) ou polícia de segurança (ex., Força Pública).

Autoridade e agente de autoridade.
Estabelecido o conceito de autoridade, vejamos agora que se deve entender por agente da autoridade.
Existe entre os servidores do Estado, que diz respeito ao poder público, uma escala que pode ser assim reduzida à expressão mais simples.

- servidores que exercem em nome próprio o poder de Estado. Tomam decisões, impõem regras, dão ordens, restringem bens jurídicos e direitos individuais, tudo dentro dos limites traçados por lei. São as autoridades;

- servidores que não têm autoridade para praticar esses atos por iniciativa própria, mas que agem (agentes) a mando da autoridade. São os agentes da autoridade.

- servidores que se restringem a prática de atos administrativos e não exercem o poder público; não praticam atos de autoridade, nem por iniciativa própria, nem como meros executores que agem a mando da autoridade. Não são autoridades nem agentes da autoridade.

Exemplos dos primeiros: juízes, delegados de polícia.

Exemplos dos segundos: oficiais de justiça, membros da força Pública.

Exemplos dos últimos: oficiais judiciários, oficiais administrativos.

Esses conceitos são por demais claros e precisos – claros em seu conteúdo e precisos em seus contornos – para que a lei necessitasse contê-los. Quando, porém agentes da autoridade, quase sempre de boa fé e com o louvável intuito de servir, se arvoram em autoridades, convém que a própria lei reponha as coisas em seu lugar. Creio que seria vantajoso aproveitar o ensejo da modificação do Código de Processo Penal para fazê-los.
Quando elaborei o Anteprojeto, o problema inexistia, pois não havia notícia de que agentes de autoridade se arrogassem autoridade própria. É lamentável engano supor que a tarefa do agente de autoridade o subalterniza e mais deplorável ainda entender que o detentor da força deve ser o titular do poder.
Sobretudo quando esses enganos são causados por melindres pessoais ou de classe que se supõem humilhadas pelo papel de agentes que a lei lhes reserva. Assim como a força militar está ao serviço do poder civil, sem que isso lhe arranhe a dignidade ou o pundonor, assim também a Força Pública é agente da autoridade policial sem que isso importe qualquer diminuição ao eminente valor que ela representa. Ferida ela fica é quando esquece sua destinação legal para apropriar-se de um poder que não é seu.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A POLÍCIA JUDICIÁRIA NA SOLUÇÃO DE CONFLITOS

Polícia Civil demandista versus Polícia Civil resolutiva
Douglas Roberto Ribeiro de Magalhães Chegury


SUMÁRIO: PROLEGÔMENOS. CAPÍTULO 1. NOVO PARADIGMA CONSTITUCIONAL. 1.1- Busca pela efetividade constitucional. 1.2-Ativismo Judicial e Ministério Público. CAPÍTULO 2. A POLÍCIA RESOLUTIVA. 2.1-Superação de paradigmas. 2.2-Fracasso legislativo. CAPÍTULO 3. À GUISA DE CONCLUSÃO. 3.1-Função Social da Polícia



PROLEGÔMENOS
Já há muito as instituições brasileiras vêm atravessando um período de transformações como nunca antes visto, algumas mais que outras. Bem verdade que muitas destas instituições, de perfil mais monolítico e clássico, resistem de forma intransigente às mudanças, quase sempre em razão do medo natural do novo, do receio de que as alterações pretendidas e eventualmente implementadas representem o solapamento de uma tradição erigida ao longo de décadas (família, casamento, propriedade, contrato).
Outras tantas vezes, a recalcitrância se deve a motivos e razões menos nobres, por exemplo, na defesa e a serviço de interesses do capital voraz de empresas inescrupulosas e descomprometidas com o Estado Social de Direito. A propósito destas últimas, é perceptível o sofisma que se esconde por detrás do argumento de autoridade acerca da necessidade de segurança jurídica para a preservação do Estado. As mudanças, na ótica sobretudo do capital internacional especulativo, são bem vindas quando os ventos transformadores lhe são favoráveis (a exemplo da globalização neoliberal), todavia, nas demais situações próprias de um Welfare State, representam risco à segurança das instituições e à credibilidade do país no campo internacional.



1. NOVO PARADIGMA CONSTITUCIONAL
1.1 Busca pela efetividade constitucional
Noutro giro, o dínamo transformador dos fenômenos de massa peculiares à modernidade não se detém ante os expedientes opostos pela elite mundial, e a "tsunami" dos acontecimentos sociais arrasta impiedosamente os bunkers anti-revolucionários. Revolução na acepção cunhada pelo filósofo Thomas S. Kuhn (A Estrutura das Revoluções Científicas), como momento de superação do paradigma anterior já exaurido.



Tornou-se perceptível, neste sentido, sobretudo a partir de 1988, com a promulgação da Carta Magna, que era chegado o momento dos novos ventos soprarem em terra brasilis, trazendo consigo a busca pela efetivação dos direitos fundamentais, principalmente os de segunda dimensão, em uma perspectiva constitucional que vem sendo cognominada de neoconstitucionalismo. Fala-se em função social da propriedade, função social do contrato, dignidade da pessoa humana e tantos outros princípios (mandados de otimização) que adquiriram materialidade e aplicação direta pelos operadores do direito, transformando as normas constitucionais outrora interpretadas como meras promessas do legislador constituinte, em dispositivos com força normativa (Konrad Hesse).
1.2 Ativismo Judicial e Ministério Público
O ativismo judicial de magistrados cada vez mais comprometidos com o papel transformador da jurisdição, e não mais intimidados pelas forças econômicas, materializa-se em decisões corajosas próprias de agentes políticos que se descobriram não mais como simples "bocas da lei", mas sim como representantes de um poder que se agiganta diante da "mediocrização" de um Legislativo corrupto e um Executivo leniente, quando não conivente.
Nesta frente, ombreados com a magistratura, destacam-se abnegados membros do Ministério Público, conscientes de que o povo, o legítimo detentor do poder, deposita sobre seus ombros as esperanças de dias melhores para os alijados da divisão de riquezas. O MP abandonou sua posição tímida de curador de incapazes e gerente dos interesses públicos secundários para elevar-se ao cume atualmente ocupado de defensor da ordem jurídica e do regime democrático, além de protetor dos mais desfavorecidos pela sorte.
Por outro lado, as deficiências do sistema judicial, mesmo tendo à frente agentes comprometidos, ainda constitui sério obstáculo à obtenção das tutelas modificadoras que se fazem necessárias, e isto por motivos mais que conhecidos de sabotamento logístico da estrutura do poder judiciário, mormente através de uma legislação incapaz de atender as demandas instrumentais dos novos direitos.
Neste aspecto, a busca por soluções alternativas que desbordem da contenciosidade morosa e dispendiosa do judiciário, forçou a construção de estratégias por parte, inicialmente, do Ministério Público para superar o gargalo da prestação jurisdicional. A iniciativa de revisão do papel meramente demandista da instituição em favor de um MP resolutivo, preocupado com resultados efetivos e não com estatísticas de demandas ajuizadas, uma vez mais conquistou a população sedenta de soluções e não de litígios.



2. A POLÍCIA RESOLUTIVA
2.1 Superação de paradigmas
O que se questiona nesta quadra é sobre a necessidade de se estender às instituições policiais esta perspectiva resolutiva e menos "demandista". Evidentemente que o emprego da expressão demandista à atividade policial não se refere a sua atuação junto ao poder judiciário, em que pese também existente, notadamente quando do exercício da atividade postulatória da autoridade policial (representações por prisões, interceptações, mandados de busca, etc...). Aqui, neste contexto, o termo demandista deve ser compreendido como se referindo a todos os meios não conciliatórios de soluções para conflitos estabelecidos ou em vias de se constituir.
A experiência bem o demonstra que a conciliação dos envolvidos através da mediação significa a construção de soluções mais democráticas e pacificadoras, o que dificilmente seria obtido em uma judicialização precoce que resultará sempre na insatisfação de ao menos um dos jurisdicionados, quando não de todos, não contribuindo de forma alguma para a concretização de um dos escopos da atuação estatal, qual seja a pacificação da sociedade.
No Estado mínimo atual, por obra e graça de um neoliberalismo asfixiante, diariamente uma procissão de miseráveis acorre às delegacias de polícia de todo o Brasil em busca de um mínimo de atenção do Estado. Historicamente, como cediço, o Estado omite-se na implementação de políticas públicas que atendam as necessidades mais básicas da população, mas não se recusa, por outro lado, a aparelhar os órgãos policiais, mesmo que de maneira extremamente deficitária, como barreira de contenção da pobreza, da miséria e da violência, objetivando, desta forma, manter afastados das zonas nobres e das mansões da elite o que consideram a escória da sociedade. Na visão dos detentores do poder e dos formadores de opinião, a miséria é ultrajante e ofensiva ao seu estilo de vida, e deve ser mantida distante de suas quadras de golfe, de seus salões de festa e condomínios de luxo. Para este papel de lixeiro social, tolera-se que a polícia muitas vezes extrapole de seus limites constitucionais na violação dos direitos fundamentais dos "estereotipados marginais", contrariando assim seu perfil desejável de polícia democrática.
Nas noites e madrugadas, nos feriados e finais de semana, os únicos órgãos públicos aos quais têm alcance os mais carentes são os "açougues oficiais" que alguns insistem em denominar de hospitais públicos e as delegacias de polícia, ambos com funcionamento ininterrupto, 24hrs por dia. Os conflitos sociais aportam nas delegacias em toda sua dimensão desesperadora. Homens, mulheres, idosos e crianças, todos buscam no único representante estatal de plantão ao qual têm permanente e fácil acesso, uma solução imediata e milagrosa para os problemas que os afligem.
Em sua imensa maioria das vezes, não se trata de autênticos problemas criminais, mas sim de carências sociais não atendidas, cujo não tratamento adequado certamente contribuirá para o surgimento de algum delito. Brigas entre vizinhos, discussões domésticas entre filhos, pais e cônjuges, envolvimento com uso de drogas, o famigerado crack, a dependência e o vício do álcool, a falta de gêneros alimentícios, conflitos entre adolescentes, desrespeito em salas de aula, doenças mentais, deficiências físicas, pequenos furtos (insignificância), vias de fato, desentendimentos em bares, carências afetivas, prostituição, traições amorosas, contendas cíveis de natureza consumerista e contratual, enfim, um desfiar de demandas com as quais a autoridade policial trava contato diuturno nos balcões gastos e ensebados de dependências insalubres e abandonadas, como é a regra nos rincões destes Brasis.
Não há recusa por parte da polícia em atender estas demandas reprimidas, mesmo que para alguns não seja esta a atribuição a ela conferida pela Constituição. O sofrimento alheio, a dor da alma, permitem que o ser humano seja desnudado em sua essência de fragilidade. As máscaras não se mantêm e o sofredor revela-se em busca de auxílio, muitas vezes agressivamente, já que não é capaz de compreender e aceitar o jogo de "empurra-empurra" de que é vítima por parte dos demais órgãos estatais desinteressados de seus destinos. Quase sempre não é capaz de compreender que a polícia não foi estruturada para solucionar o tipo de problema que o atormenta e à sua família, e não aceita o não como resposta. Nestas ocasiões os policiais atuam como psicólogos, conciliadores, médicos, advogados, religiosos etc...na intenção suprema de desempenhar um papel que vai além daquele que o Estado outorgou.
Este "know how" adquirido empiricamente pela polícia no dia-a-dia das delegacias a credencia como ente legitimado ideal para debelar na origem muitos dos conflitos interpessoais que, não administrados com proficiência e a tempo, apresentarão, certamente, consequências desatrosas no futuro. Não se está a pregar o afastamento da polícia do enfretamento da criminalidade violenta e grave que grassa pela sociedade, mas tão somente a estruturação e melhor aparelhamento dos órgãos policiais, habilitando-os oficialmente para a solução destes conflitos, ou no mínimo seu adequado encaminhamento.
2.2 Fracasso legislativo
Neste passo, lamentavelmente, iniciativa legislativa recente que pretendeu possibilitar a composição preliminar dos conflitos decorrentes dos crimes de menor potencial ofensivo pelos delegados de polícia foi barrado em seu nascedouro. O Projeto de Lei nº 5.117/09, dispunha, no Art.2º, sobre a alteração do art. 69 da Lei 9.099/95, que passaria a vigorar nos seguintes termos:
"Art. 69 – A autoridade policial, após tomar conhecimento da ocorrência, lavrará termo circunstanciado sobre os fatos e tentará a composição do conflito decorrente dos crimes de menor potencial ofensivo".
Não obstante o insucesso legislativo, a demanda social junto à polícia persiste e o atendimento de emergência nos "pronto-socorros policiais" não cessará, por uma razão de meridiana clareza, qual seja a inexistência de desaguadouro nas demais instituições sociais que travem tão íntimo contato com a comunidade como o faz a polícia. Ademais disto, no moderno Estado de Direito, o princípio da legalidade administrativa não se limita a sua dimensão estrita, senão, deve ser interpretado em uma dimensão mais ampla de juridicidade. Antes de observar limitadamente a lei, o administrador/polícia deve acatamento à Constituição e aos seus princípios.
A erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, autorizam a intervenção da polícia no campo social não apenas como agente da persecução criminal, mas também como agente fomentador da cidadania.



3.0 À GUISA DE CONCLUSÃO
3.1 Função Social da Polícia
Somente desta forma, assumindo sua "função social", a polícia retomará o seu caminho legítimo na busca do fortalecimento da democracia brasileira, na esteira do Ministério Público e da Magistratura.
Uma polícia desestruturada e envolvida em conflitos com outras instituições por atribuições não interessa ao cidadão, destinatário dos serviços públicos, mas tão somente àqueles inescrupulosos que se valem dos desencontros entre os órgãos da persecução para se perpetuarem tranquilamente na prática impune e lucrativa do crime.
Autor: Douglas Roberto Ribeiro de Magalhães Chegury, Delegado da Polícia Civil do Distrito Federal


Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2723, 15 dez. 2010.