quinta-feira, 23 de agosto de 2007

DESABAFO DE UM JOVEM DELEGADO

RECEBI A MISSIVA ABAIXO DE UM COLEGA, QUE ME AUTORIZOU PUBLICÁ-LA, MAS SOLICITOU O SIGILO DE SEU NOME.
ACHEI MUITO INTERESSANTE SEU PONTO DE VISTA, E, AO MESMO TEMPO, BASTANTE PREOCUPANTE. ACREDITO QUE SUAS DÚVIDAS SÃO AS MESMAS DE CENTENAS DE COLEGAS, SENÃO MILHARES POR ESSE BRASIL AFORA.
A FALTA DE PERSPECTIVAS POSITIVAS NA CARREIRA DO DELEGADO PAULISTA (E DE VÁRIOS OUTROS ENTES FEDERADOS) É UMA TRISTE REALIDADE QUE, INFELIZMENTE, NÃO TEM SENSIBILIZADO NOSSOS DIRIGENTES.
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Desabafo de um 4a Classe


Em Julho de 2007 faz cinco anos que ingressei na carreira de Delegado de Polícia do Estado de São Paulo e tal data foi um convite pessoal que me fiz a refletir sobre aquilo que já vivenciei e ainda o que me aguarda para o futuro que abracei como a carreira da minha vida .
Cheguei na carreira como todo prosélito, cheio de sonhos, todavia encontrei grandes percalços. Os meus colegas de turma que também tiveram que passar por adversidades que a carreira exige, muitos já não se encontram mais ao nosso lado, pois migraram para outras carreiras mais suaves ou mais recompensadoras.
A nossa carreira é brilhante, todos sabem, mas atualmente passa por uma crise grave e sem precedentes; pois instituições paralelas juguladoras do nosso mister retiram de nós o que é nosso e isto reflete em nossa imagem e por conseqüência em nossos salários. Tais instituições se apropriam em plena luz do dia e ao arrepio da lei das nossas atribuições, sem qualquer resposta efetiva de nossa classe. Infelizmente, o último colega que arrostou àqueles que nos jugulavam levou um duro golpe. Todavia, tal embate com efeito de seu empenho refletiu no ano que passou em um projeto de Lei que elevava a nossa carreira às prerrogativas das demais carreiras de Estado de atividade jurídica, passo importante para melhoraria salarial. Esse colega de quem falei, se constituía em um legítimo representante de nossa classe e, com sólidos argumentos de fato e de direito, rebatia as críticas a nossa instituição; reconstruía a imagem do delegado de polícia frente à comunidade como operador do direito e autêntico defensor da sociedade. Mas, tal colega , todos sabem de quem estou falando, infelizmente faltou em momento imprescindível em nossa luta.
Ainda do que vivenciei nestes cinco anos, além dos pesados plantões do Decap e Demacro, aliás, um capítulo à parte em nossa carreira; foi a luta da classe por melhores condições de trabalho e principalmente melhores condições salariais, mas infelizmente, sem qualquer sucesso de fato. O que observei foram tentativas frustradas frente ao Governador do Estado de São Paulo, ações judiciais sem fim, projetos de lei que não foram aprovados como a categoria idealizou e uma observação: a classe pouco mobilizada nos planos e nos projetos da carreira.
Iniciei uma modesta investigação sobre o comportamento da classe e achei a resposta relembrando um livro de Leo Huberman
1 dos tempos da Faculdade de Direito indicado pelo professor de Economia em sala de aula.
No final do livro o autor expõe um pensamento sobre a crise do capitalismo, a síntese de seu pequeno grande livro: “Segundo a história, tomam de um coco e abrem-lhe um buraco, do tamanho necessário para que nele o macaco enfie a mão vazia. Colocam dentro torrões de açúcar e prendem o coco a um árvore. O macaco mete a mão no coco e agarra os torrões, tentando puxá-los em seguida. Mas o buraco não é bastante grande para que nele passe a mão fechada, e o macaco, levado pela ambição e gula, prefere ficar preso a soltar o açúcar”.
Tal fato se impõe em todos os níveis da carreira. Mas tal conduta tem amargo preço, como vejo alinhavar-se diante dos meus olhos, pois, em que pese o Estado de São Paulo ser a segunda maior arrecadação da Federação, só perdendo para a União, um delegado do Estado do Paraná tem seu salário inicial em Oito Mil Reais.
Como não considerar isto uma grave infâmia a um Delegado Classe Especial em São Paulo com trinta ou mais anos de serviço prestados com um salário que não chega a Seis Mil Reais? Infelizmente o quadro do futuro da carreira ainda se constrói em negras nuvens. Ouvi, é verdade em conversa de elevador, de um digno representante da classe que quem hoje ingressa na carreira vai chegar ao máximo à terceira classe (metade da carreira). Não sei se tal informação procede, mas não achei de imediato descabida. Mas se tal fato for verdadeiro é só mais uma pequena decepção de quem está na carreira em meio à inúmeras.
Outra é a aposentadoria especial que parece que não virá.
Então para que não nos percamos nos caminhos tortuosos que nossa carreira exige, para que a Polícia Civil do Estado de São Paulo se erga novamente com brio e envergadura de sua magnitude, o que precisamos fazer?
Mas, para a questão não ficar vazia, faço a minha modesta sugestão: ou começamos a cumprir o lema de nossa associação (ação, lealdade e união) ou aderimos a uma outra instituição, pois hoje é melhor ser agente da autoridade do que autoridade policial.
Termino aqui minha modesta reflexão com uma poesia do citado livro acima :


“Homens da Inglaterra,por que arar
para os senhores que vos mantêm na miséria?
Porque tecer com esforço e cuidado
as ricas roupas que vossos tiranos vestem?

Por que alimentar, vestir e poupar
do berço até o túmulo, esses parasitas ingratos que
exploram vosso suor – Ah . Que bebem vosso sangue?

Porque, abelhas da Inglaterra, forjar
muitas armas, cadeias e açoites
para que esses vagabundos possam desperdiçar
o produto forçado de vosso trabalho?

A semente que semeais, outro colhe;
A riqueza que descobris, fica com outro.
A roupa que teceis, outro veste;
As armas que forjas , outro usa.

Semeai – mas que o tirano não colha.
Produzi riqueza – mas que o impostor não a guarde.
Tecei roupas - mas que o ocioso não as vista.
Forjai armas – que usarei em vossa defesa."
1Historia da Riqueza do Homem , 21 primeira edição , Editora Livros técnicos e científicos. S.A


Um comentário:

  1. Caro Emanuel, analisando percucientemente esse desabafo, vejo que ele nos dá mais força para continuarmos a nossa missão, que é a de representarmos essa classe sofrida e mostrarmos o nosso valor aos canalhas que se julgam proprietários desta Instituição.

    Carlos Miranda Mendes.

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